sexta-feira, 28 de setembro de 2018

TEMPOS FELIZES (OU O SINCRONISMO DO MUNDO) - 1995


FABIANO SANTOS SOUSA




TEMPOS FELIZES


Ou

O SINCRONISMO DO MUNDO













“Atribui-se a cada coisa sua respectiva importância e começa-se a aprender a ser justo”

Fss





































à Danielle
(Deus sabe por quê.)








A ÚLTIMA POESIA


Versos cantados, versos errados
que passam por críticas e censura prévia
versos perdidos, ou ultrapassados
carregam a frustração de uma esperança férvida

Versos reais, versos ilusórios
imortalizados, ou nunca conhecidos
versos de humor, versos de toda uma vida
em muito menos que isso são esquecidos

Versos mentindo, buscando atenção
servindo uma vida, fazendo-se armas
versos revelando o seu próprio ser
vão superando quem está a escrever
e já têm um corpo, uma mente, uma alma

Versos que brincam com as emoções
sabem ser frios mesmo ao falarem de amor
fora da difícil arte do sentido,
feitos não para serem entendidos,
mas fazem sorrir, aliviam a dor

























PERGUNTASTE POR MIM


Perguntaste por mim;
enchendo minh’alma de sorriso e desejo
Perguntaste por mim;
consolando minha dor por quando não te vejo
O quanto quiseres sempre hei de estar contigo...
Ah! Como amigo...

Perguntaste por mim
longe e aquém, em minha memória
Perguntaste por mim
ser tua lembrança é meu sonho, minha glória
Além estar contigo na alegria e no perigo
Ah! Como amigo...

Perguntaste por mim
Eu, templo onde reina teu semblante no horizonte
Perguntaste por mim
do êxtase do meu ser, a mais prima fonte
Sou todo devoção, servidão sem castigo
Ah! Como amigo...

Perguntaste por mim
com carinho, com ternura, com fiel preocupação
Perguntaste por mim
Devo estar feliz por me teres no coração
e aceitar minha sina que o que vale é estar contigo
Ah! Como amigo...




















A TEORIA DA INDIVIDUALIDADE


Não são palavras que geram reviravoltas
Nem teorias
Não somos nós que outorgamos a nossa vida
Não há plurais
Inexistem pessoas
Toda condição emana de um ponto.

Toda vida é uma e única
Da mesma fonte oriunda
Onde vive toda a força
Por isso nada supera o afã
E só o limite limita.

Os acontecimentos são maleáveis
O presente sempre é amorfo
Não vivemos em função do que sentimos
Mas do que sentiremos em tempo futuro.

As necessidades reles se evidenciam
As vitalidades serão sempre sutis
O resto é ensejo latente
Enrustido, disfarçado de sapiência.

Fértil é o presente
Cada ato atual em emersão
é o impulso de asseguração da existência
A vida é a existência
E olhos cansados não vêem além.

















SEM MÁCULA


À Dani M

Foste minha amiga, ou o amor de minha vida?
Não, não quero saber de nada antes que anoiteça
Tocas-te-me apenas porque és mulher
Ou uma força eterna e sem concessão?

Porque não é o ser mulher, ou ser homem, mas ser gente
Ser assaz indulgente com a figura do mundo
O espelho que estampa toda a Natureza
Na boca em que como canto ressoa o meu nome

E não há de ficar em nossa história
A mácula que remata todas as histórias
































A VOZ DA POESIA


A voz da poesia
Não é o “bom dia”
Nem o som do Sol

Não ecoa sinfonia
Pela brisa fria
Ou o arrebol

A textura da poesia
É a liberdade
E a invenção

A surreal filosofia
A vital necessidade
Da inovação

Se livre, ou se rimaria
Se soneto, copla,
décima, ou estrombote

Se alegra ou arredia
Se afaga
Ou se dá o bote

A voz da poesia
A superfície, a tinta
E um ideal

De fonte jamais vazia
Emerge distinta
Ressoa natural















EU TE AMO


Eu te amo, eu te amo, eu te amo
Preciso dizer; e daí?
Não me importa se verão como uma arma
Não me importa se verão o que não vejo
Ou se verão além de mim
Eu te amo
E que não se ouse questionar a minha evasão

O fato é que o amor me integra
E amar me entrega
Talvez soasse melhor apenas “eu amo”
Se o “eu” não fosse solúvel no ar

Eu te amo
Já não posso cessar de dizer
É por isso que sofro
E que deveras creio na felicidade

Eu te amo, eu te amo, eu te amo
E esta certeza me basta





















CORDA-BAMBA: TRAVESSIA DE CEGOS


Bom dia, luzes; ares do mundo!
Boa noite, noite do subterfúgio
Bom dia, relvas, ares poéticos
Alô, poetas do baço mundo!

Bom dia, príncipes e genitores
Saudações lânguidas aos jovens lampeiros
Olá malucos ou apenas cômicos
Um bom dia triste para os taciturnos

Bom dia, sombras de fiel repouso
Flores efêmeras, bom dia, flores
Todos os símbolos pra se divagar

Congratulações, meu caro sapo
Como vai a ninhada, senhor gato?
Bom dia, insetos, vermes e vírus
Todos os demais organismos

Préstimos meus às damas virgens
Paz a todas as mulheres do mundo
Queridas crianças, bom dia
Também à insidiosa juventude

Plebeus, pobres, tenham um bom dia
Que só o dia seja o mesmo

Bom dia, sereias, bruxas e vampiros
“Hello” a todos os de ‘Halloween’
Apelos da cultura popular de massa
Gorbatchov, Pelé, Frank Sinatra
Tarados, infanticidas
Sociopatas fiéis
Igrejas Universais

Bom dia, talentos e vergonhas do Brasil
O que ainda esperam
Os que ainda esperam
Esqueçam
Simples congratulações a todos!






ALUSÃO DE SÍMBOLOS


Outrora foi tempo de dizer palavras frívolas
De apreciar mágoas, cicatrizar com dor
Já foi o tempo de desdenhar das amizades
De caminhar no escuro por antipatizar com a luz

Outrora foi todo o tempo dedicado aos lamentos
Dos gestos apáticos, dos julgamentos ressabiados
Da busca desmedida pela felicidade fácil
Sem reflexão ou sentido

Agora é tempo de amar e respeitar
De dar voz aos desejos e dar vez aos sonhos
Hoje é o Sol
Transcendendo as nuvens
































DEVORADOR DE FRONTEIRAS


Sou uma máquina
Apontam-me todos os meus instintos
Sou máquina
As estradas do mundo são relativas a isso
A raiva impulsiona o meu debandar
O medo me desacelera
Transito em mil direções
Rodo como roda o mundo

Sou máquina
Um complexo plexo dirigível
Transporto tragédias e paisagens
E caminho sempre para o mar

Indecifrável explicação
“Eu-máquina”
Em eterna carona pelo mundo





























O QUE É


Serve-me, mas não me basta
A Liberdade
É o ego
Concomitante com a minha sanidade

Se me ocupo das rimas, rimo
Teço ética da estrutura poética
Transmutando do mar para o rio, rio
E mais rio quando toda a paz do dia irradia

Vem a expectativa e me cativa
De toda a sorte imaginada resta quase o nada
Reclamações são as ações
E depressão é a pior pressão


Até celebrar mais uma festa; esta
O olhar vago à revelia tudo lia
Agradecendo sendo
Agradecer ser


























SÓ O QUE VALE É SABER


Saibas neste curto tempo
Que sou só mais um que te amaria se quisesses
Mas não importa
Só o que vale é saber










































LEITE EM PÓ INTEGRAL


O que sabemos do amor?
Não do sexo do amor
Que variavelmente fazemos
Arrebatados e apossados por sua persuasão

O amor é invariável
Independente sem dependência, expansivo sem possessão
Composição única de compreensão difícil

Só sabemos do amor que amar é bom...




































BELEZA


Uma beleza divinal desceu do espaço
parou nos teus olhos, iluminou-os
prosseguiu e desaguou em curvas
repousou sob os teus pés e te sustenta

Alegrou-me
Preencheu-me
Transitando em um só sentido cobriu todas as minhas vias
Alimentou para sempre minha mente e meu coração

Se há fome de beleza, és o que sacia



































SUCO DE FERRUGEM


Espírito pobre
Sem grandeza, só símbolo
Importância questionável
Olhando para haver
Seu olhar espelhado sobre o mundo

Um pássaro branco veloz no infinito
No céu retilíneo como um Demóstenes convicto
Prantos prontos, encantos em cantos
O dia, a vida, o tempo
Dimensões artificiais em um televisor

As estrelas e a galáxia, o são e o absurdo
Substâncias com ou sem essência

O mundo aprisionado em minha janela
E eu aprisionado na janela que não é minha
Esse “refrescola” há tempos não é o mesmo
Talvez O2 sobre o seu ferro
Talvez conservantes sobre a minha língua

Somente à janela empresto atenção
Passa o caminhão de lixo
Os lixeiros carregam o conteúdo das latas dos restaurantes
Sem pedir autorização a ninguém
É a Rotina
Aqui é quem mais passa
Essa velhinha reumática
Que mora atrás das janelas

















CRISE DE DEPRESSÃO (hoje virtual) EVENTUAL


Vejo
Claramente visualizo
Não é um vulto; é concreto
Não há nada me sombreando o olhar
Nem nublando a minha percepção
É um elo
Absurdo de tanta certeza

Faz tenebroso o ar
O ensejo cruel do instinto
O lúgubre faz-se soturno
E mais pesa

Agora, a dor que passa sorri
Cheia de bondade e ternura
“Oi, querido! Que bom ver você!
Só que foda-se se você me ama...”
O amor que trai
A amizade que atrai
A diferença é pouca
Mas é muito mais
Pobre de mim se não vejo
É muito mais
Apenas o elo
O ponto limite
A dor satírica, sorridente
É obvio que minha mágoa é mais do que te ver
Nos braços dele

Difícil é acreditar no que digo
A voz poética é encantada
E é triste se pra ela ninguém liga
(não posso me derrubar sozinho) 
Mas não sou tão radical ao fugir da essência
Misticismos, faltas, vaidades
Não há ser o tempo inteiro integral
Sei, todavia, que a penumbra passa como brisa
Que o ‘eu profundo’ se expande como Sol
Que os misticismos irrompem como a névoa
Que as faltas submetem-se como a sede
E à água sucumbem
Também sei que vaidades cansam
Brevemente se esvaem
A vontade da nau
Desafia pouco o capitão
E o ensejo do capitão
É o destino da
Nau


Alô. Olá! Oi. Hey! Falou! Yeah! All right. E aí? Como vai? Salve! Beleza? Tchau...
(Muitas, muitas vozes)
Tantas que fica pesado o subconsciente
E tendo ainda que arrastar o corpo
Máquinas, automóveis, gritaria
Pensamentos liquefeitos pelo barulho
Poucos me abraçam para sentirem meu corpo suar frio

Megabytes de imagens sobrepostas
Desfiguram-se em um monstro invisível
Veloz se transmuta, dissipa-se
Estende-se até o fim da dispersão
Não se decompõe o homem
Não se decompõe o ser
Diferem-se corpo e espírito
Mas caminham somente juntos
Necessário é ver todos os lados de si mesmo
E estender um braço de cada vez...


A busca
O ponto de emersão, os fatores previsíveis
A sinfonia distorcida dos acontecimentos
Natureza indômita
Crises violentas às portas da cura
O confronto com o inexplicável
A metamorfose complexa
Negacionismo
Alimento para os vícios
Amuo contínuo
A busca pela solidão
E o afã pela morte que se contempla ao longe
O desdém dos valores

Porque pobre de mim se o que me atrai é a camisa de meu time
Pobre de mim se o que me toca é a paixão partilhada por uma banda
E pela arte, pelos planos, pelos sonhos, pela vida
Coitado de mim se me satisfaz sobrecarregar outras vidas
Com fragmentos meus
Tudo o que restar serão perfídias
Quase como amar com exatidão
Melhor ser a vida um poço de alusões
E de ilusões...

As lágrimas que minh’alma verte são de sangue
As lágrimas que minh’alma verte são de sangue transcendental
Sinto as farpas inofensivas da Física
E as mortais da Psicologia

Ficam rijas as ondas e não quebram
Apodrecem as flores e asfixiam
Envelhece a tenra e lírica beleza

Pode ser música só para os meus ouvidos
Verdade ao alcance
Posso superar tudo
Com toda superação permitida
Só não sobrepujar limites intrínsecos
Ou desligar sentidos
Saudades de outréns e outroras
E do futuro
Porém o futuro é uma incondição
Onde há símbolo, há fuga
Onde há símbolo existe poesia

Tudo isso e mais eu
Mudaria sem mim?

A penumbra soturna da mente
Disfunção momentânea gerada pelo medo
Medo da dor, morte e violência
Medo de tudo o que há de mais esconso

O clima se perde...
O clima se perde...
O clima se perde...
O clima se perde...
O clima se perde...
O clima se perde...



Toque
Ressurjo, pois, sujeito ao toque
Teu
Indelével

A natureza se expande?
É da natureza se expandir?
Índole, só índole
Ímpeto, apenas ímpeto
A junção das idéias e do instinto

Os olhos traem a visão que trai todos os outros sentidos
Distraída da percepção
E faz-se um ciclo
Virtual voraz invenção, fugaz da doutrina mais crível
Forma conjuração
E faz-se um ciclo


E TUDO SE REMATA COM O CANSAÇO...













































BRILHO OPACO


Eu me sinto arrastado para a tua tristeza
Quando inexoravelmente sofres
Quiçá seja só medo, mas sofres
E é horrível, pois não depende de mim

A tristeza ímpia que me deixa inerte
E com a qual todas as minhas fraquezas compactuam
Vem da tua dor vasta e sem sentido
Malefício espesso e extemporâneo

Não chores ou sofras querida minha
Só quando deveras quiseres de verdade
Não sucumbas às faltas
Preserves tua essência

E quando não der, sigas. Repartamos a angústia
Não anseies por soltar a minha mão
Confronte o teu medo com a barreira de mim
Plantando sempre o teu melhor

Não questiones merecimentos
Questione conselhos
Desconfie
Desafie
Saiba o que és
És especial
És linda
E só necessitas sorrir
Em nome de qualquer coisa que não te machuque
Mesmo eu
Porque o meu sonho é defender-te
Mas nunca de ti













“IVEL”
O HOMEM INVISÍVEL


Projeto matreiro
Passivo-sensível
Emparelham atrozes
O HOMEM INVISÍVEL
Divaga inerte
Incrível

Projeto voraz
Plausível
Cutucam na rede
O HOMEM INVISÍVEL
Refuta
Remível

Projeto mordaz
Cabível
Desdenham
DO HOMEM INVISÍVEL
Ímpio
Horrível

Projeto prolixo
Acessível
Invocam
O HOMEM INVISÍVEL
Lascivo
Temível

















ÁGUAS VIVAS


Os meus ares são águas
A minha voz é um chiar
Meu coração é o reflexo da lua
Do sol, o meu sorriso
Meu fluxo sanguíneo é de mar

A minha beleza são pérolas
Minha paciência, aves
Meus pensamentos, cardumes
Meus sentimentos, uma nau
Minha evasão é a chuva

Meu céu é o céu de todos os dias
Meu medo é o medo de todos os homens
Meu corpo é a minha massa líquida
Minha mente é a chance de me aprofundar






























REPARTI A MINHA VIDA


Reparti a minha vida;
Cantar e escrever
Além de, sobretudo, viver
Fazem acoroçoar-me a ser quem eu sou

Popularmente falando,
Cantar seria minha porção sensível,
Meu coração
Agora escrever seria os olhos do meu comportamento
Destarte, minha inteligência

Pífias, todavia, são todas as definições
Certamente ambíguas
Sei apenas que cantar sou eu
E escrever idem...
Escrever sou eu
E cantar idem...






























“VAIVEMVAI” – TERCETOS DAS LINHAS MESTRAS


Odnum ocitéc ed edadirepsorp
azeleb a rasnac a açnava
odnacidarre odot mob odiulf

Aiseop é aiépoposorp
sosrev sod oirtíbra ervil od ecaf a
amu aidórap ad adiv

Asep amuêlf, asep apluc
satsitarapes sopurg oãs soudívidni
e adot arvalap acifitsuj so soiem

A ahnim edadrev, me edadrev, oãn adum
res oãn odnum od rop odnum on aov oãn
edadrev ajes atid; sadot as sedadrev marof sadipmorroc

ahnimac a adiv san sahnil
salertse sad ratnilit o omoc odut odnedecorp
on omi zuler a avisserpxe edadivitejbus
























UM ENCONTRO COM O “EU” NAS RUAS DO ITAPEMA


Fatores psicológicos
O equilíbrio, a fadiga, o estresse
Os cinco sentidos
A dor de barriga, a chuva
Atchim! Agora resfriado
(pausa para a primeira topada)
hi hi hi hi hi
“Que é que foi, espertinho? Nunca viu?”
E chispa a bicicleta no amigo poste
Conversa um pouco que não tem ninguém olhando
“A rua tá deserta como sempre que não foi proposital”
“Isso é relativo”
“É crime, é crime. Fecha o bico e faz regime” – canta a sola
“Ai!” – foi a segunda topada
Medita a ação que futuca
Anda, anda e não vai longe
Grita: “sai de ti, saci; sai no ato, carrapato”
E acaba levando contigo o pentelho que tu mesmo és
“num pentelha” – resmunga a orelha
“Calma rapaz, tem paciência que o chão é duro”
“Que ingnorante falanu arto nu meiu da rua...”
Ir pra lá, pra onde?
Muito além dali e dacolá
“Vamu, vamu que tem festa e de sobremesa a paz de espírito”
“Calma que pressa é inimigada...”
“Ah, pró-verbio não”, diz a pedra
“Ui!” (e tome topada. Foi a terceira)
Ter a pia na cozinha ou no banheiro
Ou no quarto, ou na casinha do cachorro
Pra não ser intransigente na decoração
Só não falaalto queaqui é o pico dos malandros
“E aí, cumpadi? Pela ordi?”
Fooooooom – buzina o carro e atropela friamente o sinal vermelho
Psiu. Que gracinha!”
“Sou telepata, seu estúpido”
Espera que tem mais para rir com a (ai) quarta topada
“Fala sério um pouquinho que eu entreto a vergonha”
“Falo em casa que tem teto e luz”
“Teta o escurão e luze a lua”
Que andança sem destino que destina!
Que passeio solitário que quer mais é ver os conhecidos!
Que tramas mirabolantes latentes nessas ruas dissimuladas
Sedutoras corruptoras dos transeuntes
Aliciando suas deliciosas curvas
Puxando assunto, especulando a nossa vida
Indecente! Com as suas vergonhas de fora
Tendo tantos filhos, deveriam ao menos se dar ao respeito
Ou no mínimo conter seus filhos trombadinhas
Os “topadas” (tome-la quinta)
Bom, então me despeço da rua
O bip d’Orfeu me convida para casa
A casa
Home; “in the barrack”
O fazer coisa nenhuma no lugar nenhum aonde eu não ia
Pelo nada pra fazer lá
Não se ofenda amiga placa de retorno
Só quero que os espiões me chamem perdido
Porque já me viram
No mais, são só quarenta quilômetros
Eu dando a volta no quarteirão
O pior de tudo são essas topadas
Que já vão lá pela conta das quatorze...
Ui... opa... ai...

Fim da linha no sentido figurado
fim da linha





















TEMPOS FELIZES

À Danielle de Mello

1ª Parte (O Entardecer)


Fechados os olhos, sonhamos
Os nossos ares se enfeitam
As nossas almas flutuam
E tudo nossa visão interna verte em beleza

Feliz o homem que guarda seus sonhos
Felizes os sonos que sonham eternos
Porque o que regozija primeiro
Profundo e certo se esvai

O que nos fica do que só às mãos transpassa?
O que brota do que em sonhos se transfigura?
A razão é a estaca da vida
A beleza é a sua tenda...

Para ela o meu brilho
E a reverência de minha feição poética
Ela que me emociona
E que irrompe as barreiras da maravilha
Ela que parte
Com a enésima parte do meu coração
A se perder no espaço-tempo
A personificar o corpo e a alma da saudade
Ela que me guiou
E que me viu sem me conhecer
Que é importante demais pra deixar a tristeza
Que na memória se oculta
Atrás dos sorrisos que já me brandiu
Ela que parte sabendo
Ter no mundo, no mínimo um
Incondicional amigo
Para muito além da presença
Que os nossos destinos despedem.







2ª Parte (A Aurora)


Abrimos os olhos para partirmos
Pondo à parte as ilusões e os sonhos
O estado puro e simples de se viver é a Realidade
E seu acolhimento de limites

Por que se deixar abater?
Por que permitir que fluam lágrimas
De um rio de desespero?
Nada vale que te deixes triste
Nada importa que te descontente

Tomar, assim, sem medo as rédeas do destino
E buscar as belas imagens eternizadas na memória
Para sempre nos fortalecer.
Lembranças mágicas
Que em felicidade concreta a vida irradia
Cintila e resplandece
Pulsa e anuncia

A dor nunca te alcance
A luta nunca te canse
De alegria sejam teus dias

























MORTALMENTE


Bati às portas do meu destino
Entrada principal, porta dos fundos
Não importa
Se todas as palavras são alusões

Os sentidos mutados em sinais
São mensagens e nunca perfeitas
“Destino” é palavra suspeita
De sobrepujar o presente

A luz d’agora ainda é a luz d’algures
Apenas o ar que nos cerca pesa ou não mais
Virtude fez-se o que era praxe
E praxe fez-se coisas horrendas

Luzes; ares; pobres símbolos
Condicionados a serem representativos
Submetidos vivos como seres vivos
Mas não, nunca manipulados

Na terra discute-se tudo o que é clareza
E nega-se a desinformação
Exige-se paciência
Só a desconfiança cansa

Tomba-se a porta, forja-se o futuro
Respeita-se a soberba dos símbolos
A tua mente se liberta e liberta te pode matar
E matar...















PULCHRA PUELLA (Poemas sentenciosamente líricos) - 1995


FABIANO SANTOS SOUSA








“PULCHRA PUELLA”
(Poemas sentenciosamente líricos)



































“TODOS JOGAM,
TODOS PERDEM”.
                    Carlos Simões
















1 – CHEGA A HORA



à Íris

Chega a hora de reviver o que era fácil
O que era fácil também era praxe e só a praxe facilitava
Inovar é virar a página e não ser mais eu
Ser, por exemplo, outra
A que contempla a borboleta e o morcego
Ter um nome para permanecer esconso
E novos conceitos para permutar.




2 – UM POUCO DEPOIS DAS LUZES


Um pouco depois das luzes
à luz da madrugada
A aurora chega e a paz irrompe
A brisa ‘calma emoção queimada
Até o sol brilha, mas não brilha nunca
como o olhar-essência de minha amada

Os olhos que interrogam;
divinas jóias aquém lapidadas
graciosidade e alegria
valentia determinada
E daí? São belos, mas não brilham nunca
como o olhar-essência de minha amada

A infância que ruge de festa e medo
que dorme em tenda maternal delgada
A vida pueril como o nascer do dia
Os sonhos mais perfeitos por drenarem nada
Olhinhos que brilham, mas não ainda
como o olhar-essência de minha amada

E daí o ar, o espaço, a vida
O canal divino às maravilhas dadas
Inteligência, sabedoria
sem serventia a vidas apagadas
mas mesmo a vida, tal não brilharia
sem o olhar-essência de minha amada

E os olhos dela, por que me inspiram?
Por que me piram em ânsia apaixonada?
Como corrompem todo o meu ser
amansam-me também, tal voz adocicada
destarte vão o poema seria
sem o olhar-essência de minha amada

Esperando nada e já esperando pouco
minh’alma tácita olha a alvorada
as lágrimas sentenciam  que era previsível
sorrir por entre a desilusão calada
Difundo-me como explosão de uma estrela imensa
no infinito-olhar-essência de minha amada

(mas jamais como os olhos dela poderei brilhar).




3- PRISÃO DE FLORES




Estou imobilizado
De corpo e alma imobilizados estou
Amanhã me oporei a ser cativo
Mas agora só quero pensar em flores
Crisântemos e dálias sob a chuva
Cortinas de pétalas de rosas e margaridas
Rios de violetas silvestres e acácias
Templos de angélicas e begônias
Petúnias de todas as cores
Papoulas de outras cores
Creia que amar é motivo para se pensar em flores

26-01-95




4 – CLÁSSICO DE TODOS OS TEMPOS


Eu amo
Pesa-me dizer isso
Mas digo
Eu te amo
Nos teus olhos se esconde a minha felicidade

Minhas idéias também se escondem
Mais do que os meus atos
Não sei o que posso ou o que mereço
Mas sei que te amo e daí anseio

Tenho medo de mim
Medo somente de mim
Eu sou tudo o que tenho

Vem andar comigo nestas ruas calmas
Caminharemos de mãos dadas pelo paraíso
Sentirás de mim o amor profundo
E ouvirás meu coração pulsar o teu nome

Vem envolver o meu ser como sendo o mar
Ambos abraçados, ele aos nossos pés
Que o que é tão claro em minha mente
Não comece nunca a ficar distante

Não me diga que queres; dize que faz
Pretendo viver eternamente de sonho
E deixar de sonhar sozinho

26-01-95




5- LÁPIDE

(à Luciene Cavazine)

Há coisas que não pago para ouvir nem dizer
arriscando-me a pendê-las ao esquecimento e à decepção
meu coração é plácido e suave
quando está nu
Ao ser acuado, logo se encrespa
arrebatando todo meu corpo consigo
Hemos de morrer unidos

Deixar que o amor manipule sua vida é fácil
estando a par de que, do amor, ela não será sua
ou ele será seu
ou você será dele
daí o delírio, o medo
a castidade feita imprudência

Perguntar sempre se te amo
sem subjugar evasões de descrença
satisfaz-te e eu de respeito rejubilo
dispõem a ti um relato romântico
em seguida pouco é maior do que o momento
A toda resposta cabe a negação

Há situações que não podem ser cobradas de mim
Isto seria desprezar-me a natureza livre
A minha hora certa não é certa, mas é minha
Se eu divago, isso escapa de meus olhos
Estonteado, sacudam-me
Sarcástico, agridam-me
Liberto astarte, condicionem-me
Agora, se estou feliz não me desviem
O que restaria no meu olhar seria desdém
Gosta um pouco de mim, confia um pouco em mim
E não te prometerei nada

Até segunda ordem, o que vale é o que encerrou o nosso dia
embora seja sobre tuas mãos a terapia de minha metamorfose
Tu que não és lúcida nem metafísica
mas gostas de mim, confias em mim
Dir-me-ás o teu tempo justo
E com o presente de minha vida dou-te minha esperança
Não fosse assim, não era...

23-02-95


6 – A “PSEUDO-RESPOSTA” DE LU CAVAZINE


Também há coisas que eu não compreendo
só que o meu eu não pára na barreira das comparações
tem sido-te fácil apenas tanger a humanidade
falta esbarrares em mim
nunca me procuraste como experimento
pouco ou nada sem fronteiras me viste
por isso me obstruo tão fácil
nossos instintos pouco se distinguem
ambos não temos escrúpulos
eu faço disfarçar-me...

Banalizamos um instinto, algumas vezes
até, pela primeira vez num diálogo direto
deixares escapar dos teus olhos um senso
Não me culpo se ali estavas enfraquecido
Com a sinceridade lúcida, gostei
embora então não precisasse daquilo
Perdoa-me as palavras vis
Sei que o teu intuito era empunhar minhas tendências românticas
mas, definitivamente não és o amor de minha vida
este jaz algures
e tu ficaste aquém comigo.

25-02-95




7 – “SISTEGMATISMO”


Poemas
Sentenciosamente líricos
Uniformes e inflexíveis
Sistematicamente redondos
Como o mundo de Colombo
Insensivelmente já pré-estabelecidos
Taxados e lapidados
Autênticos opositores da livre criação
Retos e lineares

Altivos, enfáticos e tristes
Cruzam as barreiras científicas
Recuam nas curvas emotivas da sensibilidade
Alinham-se para não serem metafísicos
Como não ser sonhador sendo romântico?
Inferiorizar-se, delimitar o amor...
Atroz é o sistema que torna vítima

Nobre e puro espírito
Manchando com sangue de martírio as paredes e o chão de cárcere altivo

Pulchra puella
Outros épicos e nomes seriam sugestivos
Essencialmente há de ser lírico
Seguramente há de ser livre
Insipiente e insensato
Acima de tudo, rei em seu espaço.

22-03-95




8 – PARADIGMA


Se Ana, se n, se nenhuma
se outra, se a mesma, se ninguém
não ama alguém, qualquer, também nenhuma
não Ana, não outra, mas n

Se Ana, não n com certeza
com a clareza de que também se n não cab’Ana
Se sucumbe Ana à quimera reluzente démodé
e n perdura eternamente

D’Ana guardo o sorriso
n transmuta o meu ano
sendo quem amo

22-03-95




9 – “IMPURICIDADE”


Aspiro tatear a gramática
Alcançar a magnitude das palavras sem infringi-la
Daí dançar com a arte
Ter na palma o espírito pedante de uma sociedade culta

Alguns se abarrotam
Estão repletos de valores resultantes de uma vida imoralmente abastada
Outros estão lassos
Têm apreçados seus valores e sentido de existência
O que esperar sendo pobre insipiente?
Ora, o sincronismo do mundo...

22-03-95




10 – EVOLUÇÃO


Retrato da minha infância
guardada plena estima
o ego amoral, pueril
sob o pé da laranja que não é lima
incipiente visão da vida
tão expansiva quanto a rima
(Teólogo da Evolução assina)

Espectador das belezas tenras
como o vaivém do mar e dos sorrisos
as farras e estripulias
os berros de alerta e aviso
trilha da insensatez
dogmatismo constantemente impreciso
(Teólogo da Evolução assina)

E nessa própria canção de exílio
onde abarrota a história a superfície das folhas
a inconstância aciona a decorrência
viver não se condiciona às escolhas
a vida são as fases da lua
a memória é um mapa em uma garrafa de rolha
(Teólogo da Evolução assina)...
                                             ... (uma involução).

23 e24-03-95




11- “FATIDICIDADE”


Vejam todos essa revelação:
viver é uma vasta e extensa armadilha
A felicidade é uma capa para o sofrimento
que, por sua vez, é um outro nome para a insanidade
Ajuda-me, poesia
Eu estou louco
Estou completamente looouco de amor
Nunca me senti tão dependente
Meus pensamentos nunca tão pendentes
Amar é tão bom como aventura
até se ter que amar dentro da própria vida
e ser tomado por inteiro
Socorra-me inspiração!
Podes me condicionar mais leve?
Podes sombrear a ilógica da vida?
Estou condenado a morrer de amor
e gostar disso
Eu que previ ser maior do que a ficção dos romances
Ser maior do que qualquer previsão
Só não previ o que pudesse abranger a realidade
Às vezes sou tomado pelo terrível medo da perda e do seu pós-vazio
Amar não oferece garantia qualquer de suas impressões de segurança,
preservação, integridade
por isso apavora e esconde o terrível monstro dos sonhos:
a loucura
e seus cavaleiros errantes
o ciúme, a intensificação da saudade, a possessividade
Mas pior do que tudo é o abismo que a ausência gera
A ridicularização da independência individual do estado de ser
E nisso tem de tudo
Vai da rara beleza até uma porção grande d’egoísmo
E tudo para quando “redescubro”
que ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
Ela me ama
me ama...
E se me ama basta para matar o meu desejo
Calar o ato de coesão do medo
e corromper o meu ego
Eu a amo
Fica-me fácil de dizer o tempo todo
menos na minha mais pura expressão
Os meus olhos transversais sempre revelam dessa face incauta a antítese
Acontece que tudo o que é fácil, difícil ou médio
é fato
E nós nos amamos.

27-03-95




12 – “METAMIM”


O que queres de mim agora errante Eu?
O que hás de querer?
Que indo ao cemitério, diante do túmulo de meu pai
eu diga: “Sinto muito, papai. Não queria que tivesse sido,
estivesse sendo assim”
Sim. Eu não queria
Sim, eu mais do que lamento,
mas não vou
Não me peça
Não se canse
Eu não vou
Não vou
Não lá
Eu não quero nem desejo
Que não espere Eu então isso de mim
conhecendo minha própria empatia pelo mar da morte


Poemas líricos, não é?
Bah! Pois que doravante seja lírica essa podridão que trago em mim
Seja melodramática e romântica toda a minha dor
Que se invalide o meu tormento
em nome das maravilhas da humanidade
Meu físico ostentoso contenta
Minh’alma morre de inanição.

28 e 30-03-95




13 – USE TERMOS CIENTÍFICOS


Vamos todos usar de sinonímias
Palavras que ocultam nossas verdadeiras palavras
Períodos emaranhados e antiobjetivos
Nesta vida, imprescindível é ser eloqüente
O amor, se existe, deve permanecer no âmago

Apaixonado
Não é certamente o que se quer dizer
Envolvido, sim; interligado, sim
A fraqueza transmuta-se em restrição
Parâmetros são coisas da vida social
Toda sociedade é sinonímica
Sem deixar que nada tome as formas do mistério absoluto
Dá-las-emos as formas mais camufladas
Tornemos passivas as normas e emoções
Pois hão de serem elas a gloriosa ruína mundial

Sim, rasgue os planos da vida
Repinte as cores dos sonhos
A vida agora é o mesmo símbolo
Superdotada de um conceito novo de semelhança

Use termos científicos
Use-os para ferir e elogiar as pessoas
Use-os deveras para expressar os sentimentos
Assim talvez seja resgatado do coloquial
O que é lírico

31-03-95




14 – À LUCIENE CAVAZINE


Ó imagem impecável de divina criatura
Grandiosa face pura como o nascer vago da manhã
Plana no pensamento como o rasante de celeste pássaro azul
Pronta para matar de sede como a água mata d’amor

Ó reminiscência idealizada da Mitologia
Ninfa lírica em austero alazão dourado
Planando nas nuvens sobre o dorso de Ísis
Até ascender Afrodite

Ó fragilíssima alva e delicada rosa
A se banhar no orvalho do centro da noite
Até despojar as pétalas por seu amor ao chão

Ó afago de Deus na cabeça do planeta
Que deslumbra olhos e transborda corações
Mulher fulgurando o amor e a inspiração

31-03-95






15 – RATOS ESTÚPIDOS


Ratos estúpidos, grilos estúpidos
e a timidez sussurra o meu nome
Sim, são restritos os belos imaturos
dissecação de invertebrados, experimentação de homens

Ratos estúpidos, grilos estúpidos
Ah, nós herdamos a inteligência e as emoções!
Ah, pobres bichos estúpidos
pedimos e perdemos mais do que vocês

Ratos, grilos, sapos estúpidos
Não prestam nem mesmo para rimarem o soneto
e nem incomodam como as mariposas

Ratos assaz mais estúpidos
grilos loquazes e estúpidos
como o estúpido pavor pelos sapos

31-03-95




16 – PRIMEIRO DE ABRIL


Mentironas, mentirinhas, mentiras médias
insídias, armadilhas, “xavecadas”
a piada do ano, as melhores “estórias”
acordos de paz pelo mundo inteiro

Passos largos do país, meu time campeão
O perdão de muitas dívidas, a resposta a muitas dúvidas
É hora de sonhar o impossível
e de realizar o irrealizável

A GRANDE poesia, o livro ‘best-seller’
A harmonia gramatical, a sistemática científica
A mulher idealizada de uma vida perfeita

A verdadeira verdade em seu todo absoluto
por ela não refuto e a ninguém confundia
abre parênteses em 1º de abril

1-04-95







17 – INFIDELIDADE


Não, não, na frente dos olhos isto é horrível
Ponha os olhos na frente do coração
Faça da consciência um espelho
E passe a rever cada gesto de flerte

Pouco convívio, poucas palavras
Não pesam para ser-se anti-social
Os egoísmos são nossos filhos
Mil facetas e artimanhas para macular o amor

O coração não se vê
A consciência nada reflete
O tropeço da vida é na insurreição

Manusear e moldar a fisiologia humana
Depois ama e sorrir dormindo
Sob o “pós-repúdio” de ver tudo normal

4-04-95




18 – CORTÊS


“Soneto petrarquiano, soneto camoniano, soneto fabiano”
Não disfarço nem critico a derivação
Agora quero ser pai, mesmo sendo insano
Dar uma ênfase poética a minha criação

A mesma eu embalo enquanto tenho chance
Daqui a pouco chega o trem da liberdade
Que vai de uma paz conjunta até a infidelidade
E o trem da harmonia talvez não alcance

Os beijos e os afagos não estão guardados
Por não dizerem o básico a ser revelado
Nem para tudo a simbologia dos versos aceita relação

A infância poética não é de imposição
Seu poderio que não pode ser negado
Faz-se de funesto à adulação.

4-04-95




19 – MEU NOME, MEU SER

I

Meu nome, meu ser
Meu nome
Minha nomenclatura do ser comum
Minhas aptidões e minhas carências
Meus defeitos e meus desejos
Meus pensamentos especiais
Que ao menos a mim me parecem
Meu tudo, meu simples
Meu eu.
Fabiano Santos Pereira de Sousa
(um bis de toda a estrofe para compor o meu ser).


II

Cale a boca, Alberto Caieiro
Não creias que conheces tão bem os símbolos
E nem conheces tão bem a ti mesmo
Tão lúcido, tão intacto!
Passaste pensando em não pensar nada
E pensando em não pensar nada pensava coisas demais
Porque para não se pensar numa coisa é preciso antes pensar na coisa que não deve ser
Pensada
Uma atitude impensada de pensar que consome o próprio pensamento
E a vida se torna de todas a mais comum.


III

Calem-se também poetas, críticos e leitores que concordam comigo
Não tenho a verdade de todo em absoluto
O meu ângulo visual nem é mesmo transversal
O que tinha de Caieiro
Talvez não tenha mais
Nada é o mesmo
Todo certo instante é único
Cada estado e sentido são exclusivos
Não quero saber o que difere esta pedra da pedra de um minuto atrás
Estou certo, pois, que esta pedra não é a pedra de um minuto atrás
Posto que só pode ser a pedra d’agora
O resto é ilusão.
(26-01-95)


IV

Preciso estar de fato apaixonado para realmente sentir
Com toda a minha naturalidade, com toda minha angústia
Feliz totalmente a gente nunca é
Errado ou não, quer-se sempre algo mais
Correto ou não, mas sempre contente com o que se tem
Viver não é ir a um mero parque de diversões
Feito essencialmente excitante certamente por ser efêmero
Também não é ir a tendas de cartomantes ciganas
Com bolas de cristal dejetando filosofias
Viver é bem mais simples do que isso
Embora de compreensão muito além dos nossos meros limites.


V

Nosso eterno mundo é de comparações
Por que ser e não ser assim...
Por que está ou não está errado...
O mundo onde cada um é tão individual
Poderia ser o mundo de uma só pessoa
E as outras pessoas também teriam o seu próprio mundo
A humanidade não existiria
A não ser para quem tivesse nas mãos o Universo
E de um só ângulo olhasse todos os mundos
O indivíduo do mundo adormeceria
De sua costela, mulher nenhuma se criaria
Amaldiçoaria o ato de sua criação
Sucumbiria a orgias de sua carne
Guerrearia contra si mesmo
E tudo destruiria para se convencer de sua grandeza
Crucificar-se-ia
E odiaria o seu individualismo
Só então perceberia que poderia amar
Apenas amar a si mesmo
Como a mais ninguém.


VI

Não pretendi ensinar quão a falta de amor mancha a criação
Apenas disse palavras de amor porque estou amando
Como sempre precisei estar em cada momento de minha vida
Como preciso do perdão porquanto eu falhei
Meu amor d’agora é vago e gentil
Qual não se troca jamais por nenhum outro
A água límpida da fonte cristalina dando um banho na alma
Até o sorriso é diferente

VII

Não vou me importar de falar dela
Por senti-la em mim comecei o poema
Ela em mim por ser única
Sua capacidade de inspirar
Deslumbrar, seduzir
Irrompendo a rústica armadura de meu ser.


VIII

Algumas pessoas dizem “oi”
Outras dizem “Oi. Tudo bem?”
Há mesmo aquelas que não dizem nada
Aquelas que dizem “oi” na hora errada
Quando deveriam apenas sorrir
Ou que apenas sorriem
Quando deveriam dizer “eu te amo”.


IX

A dor não é para sempre
Iludem-se os que pensam que ela é
Se algo de nós fosse para sempre
Mais fácil seria ser o amor
Sendo fácil o amor não seria o mesmo
E aí sim, talvez a dor quisesse ser eterna
Mas não seria
A vida é magnífica
Porque a dor não é para sempre.


X

O que é bom é inquestionável
Seja o que pode o corpo, a mente ou o espírito
Por isso, ser impassível é ser pedante
Pode-se ter a pele mais dura
A mente desconfiada e parcialmente fechada
E o espírito adormecido
Ou sucumbir aos dois ou a um
Mas isso nunca destruirá a tua natureza
Na essência do teu âmago ela reina
E ela sabe; o que é bom é inquestionável.


XI

ÀS VEZES EU PRECISO DE INSPIRAÇÃO
E às vezes preciso apenas de alguém para abraçar
Alguém que me ame
E se possível me compreenda
Ou no mínimo alguém que também precise abraçar
E ser abraçada
Sem análises e frases longas
Isso não é estar apaixonado
Por isso também preciso me apaixonar
Sonhar com esposa, filhos e a natureza
Sonhar tudo isso com você nos meus braços
É mais do que uma simples insinuação
Não quero saber qual seria minha maior alegria
A alegria necessária é suficiente
Que começa a nascer quando se aprende a amar
O que invalida é como a inspiração
Pra prosperar é preciso sinceridade

BOBAGEM!
TALVEZ NÃO SE POSSA MESMO ESCOLHER.


XII

JESUS; filho do DEUS vivo
Esmagador dos deuses falsos da terra
Desprezastes a ignorância dos homens
Exercendo sobre eles a piedade e o exemplo
Guardai-nos com os vossos anjos
Desse mal que não descansa
Livrai-nos de sua fúria
E tende piedade de nós.


XIII

Não me cabe olhar a civilização
Mais do que civilizar
Não cabe a eu almejar o bem
Mais do que beneficiar
Como poderia exaltar o amor
Senão amando?
Fazer não basta
Tem de perdurar.
(27/01/95)


XIV

Se vier a morte amanhã
Não há de mudar muito o meu “agora”
O meu “hoje” será, da mesma forma, tranqüilo
O que eu sei é que se a morte vier ou não vier
O amanhã virá
E não espero de amanhã mais do que faço hoje
Assim viver seria um equívoco
A espera da vinda de um outro dia
Que sempre sendo o atual terminaria.


XV

Tudo o que eu digo são palpites
Assim como a minha morte oscila entre acidente de trânsito e ataque cardíaco
Flagro-me convicto demais, desconfio
A não ser que não veja mais nada
Quando se ama não se fala de morte
Besteira! Só por que ser amor, amor não muda
Mudar é se destruir
Em nome de perspectivas
Diz-se disso “apostar”
Não aposto na vida
Tudo o que digo são palpites.


XVI

A paixão tortura
O amor é mais calmo e simples
Às vezes é necessário dizer “eu te amo” sem esperar resposta
Mas quase sempre isso é frustrante para nossa sensibilidade
Queria afogar-me
Afogar-me num mar de naturalidade
Ser ator convicto cobre as fraquezas
Mas não encobre a voz que me diz que é uma peça
Exumaria minha mente
Racharia meu crânio e examinaria meu cérebro
Tripudiaria sobre ele, esmagá-lo-ia
E fitaria as mortalhas de suas partículas
Já com meu coração nada disso faria
Ainda que reconhecesse a mesma voz da intromissão
 Apenas o fitaria com desdém
O coração é a paixão
O cérebro, o amor.


XVII

Meu canto não é como o meu sentir
(às vezes é)
Daí, logicamente, meus versos não são como a minha música
Cantando eu sinto mais depressa
Depressa como o dia não passa
Na poesia sou mais detalhista
E mais informal
Fundamentei minha obra numa espécie de liberdade
Que bela ou vã está satisfeita

Luciene Cavazine.
Por que está aqui esse nome?
Por que achas que está aqui?
Porque é para estar.
É para irromper as fronteiras de minha obra
Como brilha doce e intensa em minha vida
Dane-se saber o que se sente
Sente-se
Sinto
Sento.
A mágoa me entoja
Mas mágoa, descaso, arrependimento, depressão são primos
Não se cela nada
Nem se cela o amor
Como se carimba uma carta de correio
O que se veda com certeza é só as tampas dos caixões
E o ensejo da hipocrisia.
LUCIENE CAVAZINE
Não fecho minha boca para falar de amor
Se flui com graça em minha prosa e canto
Se jeito e olhos, e boca me inspiram
E nem em mim mesmo quero ser sozinho
Podendo estar mais contente
Não pares quando peço um tempo
Fujo, sou rápido!
Sabendo que logo te esperarei
Abraçado ao motivo para ficarmos juntos.


XVIII

Quem disse que o amor é lindo?
Nada de lindo tem
Nada é bonito demais para ser lindo
Lindo é uma palavra fútil
A minha compreensão é fútil
Fútil é uma palavra fútil
E lindo é uma palavra linda!
Deixamos as cousas evadirem-se por elas mesmas
Afinal, somos os pais das palavras fúteis
E os propagadores de uma vida linda...
(28/01/95)



XIX

Às vezes queria agir sem pensar
Às vezes queria “impensar”
Que meu cérebro apenas me conduzisse
E soubesse amar sem pensar
Pensar é um desafio
De lutas intrínsecas por compensações
Instintivamente se vê a linha do horizonte
A milhares de quilômetros do mar
Pensar é ser mar
Transcrever o vaivém de suas ondas
Quando o meu peito fica pesado
Só queria pensar em sentir
Sentir não é pensar
Sentir é pensar além.

Um poema é um poema
Uma música é uma música
Coisas que não pensam e não sentem
Transcrevem-nos apenas
Como transcrevemos o mar
Que “retranscreve” os nossos pensamentos
O país dos pensamentos é um tanto inóspito
Ao Amor
É sombrio e hostil
Mas, ele sobrevive
Em toda parte de meu ser
Personificar e comparar a nós mesmos
É importante demais
É exaltar a maravilha da criação
Como não poderia deixar de ser
Personificar é estar pensando

As pessoas mais livres pensam menos do que eu.
(29/01/95)



XX

MUDAR.
Palavras não podem mudar as pessoas.
As mentes só têm as respostas.
Mudar?
Palavras não podem mudar as pessoas?
As mentes? Só têm as respostas?
Algumas pessoas esquecem-se de se conter
Falta saber qual o peso das palavras
E quando realmente tocamos a realidade
Oh! Garotas e algemas...
(30/01/95)



XXI

Entregar-se aos sentimentos não traduz libertação
A liberdade inexiste
A realização é uma sombra
 Uma sombra do tamanho dos sonhos
 Ofuscando o concretismo
Gostaria de viver deveras o sentido da
Li-ber-ta-ção
Indo além da simples utopia
Só o que me sobra é metáfora apregoando semelhança
A minha semelhança é de todo original
Um todo chamado Humanidade
(31/01/95)



XXII

Sou um escravo do amor em fuga
Meu capataz é o meu próprio ser
Não sei onde começa e termina a minha integridade
Não vejo o meu espírito
Mas sei que ele me alimenta
Cobra-me
Deposita todo o seu peso sobre mim
E não raras vezes excede os limites da integridade
Que desconheço.


XXIII

Se me amas, pouco sabes de mim
Ou me vês num mar de ilusão
Agora, se me olhas tendo receios, e medos, e tristezas
Olhas cinco minutos ininterruptos para minha pele, meu externo
Esquecendo-se, no entanto, de olhar minha essência
E se de fato nem imaginasses qual sentimento preponderante tendo a despertar
Serias sábia
Se existir fosse uma ciência exata.
Mas, se olhas para a Natureza e lembra-te de mim
És sábia, pois não estás louca por me conhecer.



XXIV

À parte isso, odiar-me é poder odiar a qualquer um...



XXV

Meus olhos secam as coisas
Meu rústico olhar às vezes quer ser independente
Quer bajular a parte escura do meu cérebro
Sou um homem fraco
De mente fraca
E um espírito tênue
Vigiados pelo instinto
Fracos ao que vem de fora
Forças drenadas por intensos conflitos
Violentas explosões
Minha dor intrínseca se propaga como radiação
Eu sou um símbolo
Minha linguagem simbólica responde
Sem se preocupar se excede
Vê-se mais louvável do que um ilusionista
Estes versos poderiam levar-me mais longe
Poderiam até me libertar
Mas os tenho feito para serem escravos
E para ilustrarem uma parte de meu todo
Parte que seria meu nome
Parte teria de meu ser.


XXVI

Com muita facilidade estou cansado
Fico cansado como fico pensando
Dormindo e “impensando” relaxo
Mas sempre pronto para pensar e me cansar
Poderiam me dizer que estes versos não têm importância
E que tudo o que eu fiz é inútil e sem graça
Isso não me cansaria
Nem me faria ficar pensando
Mas já que não dizem, penso
E daí é um passo para estar cansado.


XXVII

É fácil falar por antíteses
Cantar o bem prevalecendo o mal
Esquecer de dizer que na verdade
Ama-se a vida, os amigos e o cotidiano
Ama-se a pátria, os pais, o Universo
Apenas os olhos mantêm-se em constante movimento
Esperando ver para colher mais
Mas ama-se como eu amo.


XXVIII

A vida tem sentido por si só
Pode-se viver sem qualquer coisa abstrata
Para se respirar em nada faz falta a felicidade
À parte isso, saibas que és muito importante para mim.



XXIX

Espero que meu professor de Filosofia não queira tocar na minha mente
Que pretensão a dele, querer tocar nas mentes!
“Filosofar é pensar”, ele disse
Lecionando pensamentos?
Ou perdendo-se numa ciência que não é ciência
Falando de um pensar que não é pensar
E uma introspecção que não é individual?
Não, vã filosofia
Não queira abraçar a minha mente.


XXX

Uma verdade nova é estar apaixonado
Saber que por um tempo futuro pertencer-se-á
E tudo é lindo e maravilhoso
Menos quando tudo é medo e solidão
Que jaz no fitar do semblante
No beijo apaixonado, nas palavras de carinho
Estar sempre parado, a esperar
Esperando para abrir mão de si mesmo.
Tudo isso é lindo!
Tudo isso me comove como nunca antes
Achar que pertenço e estou apaixonado
Libertar-me a ponto de fitar o absurdo
Transcender o primitivo, simples, próprio, concreto...
Pela Lua eu estou apaixonado
A lua eu sempre amei
Com o meu Amor de poeta
E o meu amor de “eumano”
Guardei para Luciene Cavazine
Para este ano, foi-me guardado sentimentalismo
Os anos seguem mesmo que tocada minh’alma
Teu seguro é a liberdade
Teu seguro és tu.

A Terra gira e já há novas mulheres em minha vida
Todas precisam de mim
Uma delas é minha irmã...
(7/02/95)



XXXI

APAIXONA-SE APENAS PELO MÉTODO DE INDUÇÃO.



XXXII

A quem possa interessar
Minha história é livre
Minha obra é apenas mais uma obra
Meu tempo é apenas mais um tempo que passa a ser escrito
Não tenho que desconfiar
Não tenho de ser inseguro
Não tenho de morrer em preocupações
Só preciso ser simples
E aproveitar o meu amor sendo eu mesmo
Amando como ama Fabiano Santos Sousa
E até pensando como ele
Quando faz por merecer.
Achei que poderia me dividir
Achei sinceramente que ser um era ser o mesmo, um mesmo
Não é.
É mais fácil tudo na vida ser ficção.




XXXIII

Em que me encaixarão, por obséquio?
Num “extra-modernismo”? Num “ultra-realismo”?
Num mesmo simbolismo?
Criem a História das obras, criem sua arquitetura
Até se esquecerem de proliferar.


XXXIV

Poema é o que se escreve sobre linhas fechadas
Para além de meros versos vai a divagação...


XXXV

Começo a escrever com a pretensão de fazer emergir a melhor de todas as poesias
E agora já não posso fugir do assunto
Cada verso dá sempre o seu recado
Mesmo que nada tenha dito e nada mais tenha a dizer.



XXXVI

Sou um homem de bem
Todavia condutas não são irrepreensíveis
Se a todo instante meus pensamentos mudam, eu poderia ser muitos
As linhas de meus horizontes querem sempre se deslocar
Fosse muitos, sobraria.

Em nome de toda minha obra até aqui atende esta poesia
Ela é minha biografia rústica e o espelho de minha essência
Uma auto-definição não me permitiria ser prolixo
Por isso ela vive de minhas palavras de praxe.

Espero casar para entrar numa nova vida
Espero casar para tudo mudar.
Daí uma espécie de biografia inteira pode apresentar nenhum sentido
Não é necessário aparentar sentido
Vital é ser sentido
Consequentemente, sentir.
As coisas anormais de que não falo são coisas normais para mim
Embora, do que não entenda, olho muito e falo pouco
Meu medo de errar inexiste
Pelos tantos a quem represento não passarem de mim mesmo
Não se acredita no que se diz
Conhece-se o que se pensa.
Assim mesmo, com sujeitos inexistentes
É, talvez eu ame a minha língua
“or maybe not”



XXXVII

Pudesse por mais convicção nas palavras
Não lhas poria
Bem saberia que ainda assim estaria insatisfeito
Se pudesse estar satisfeito
Mais nada teria a dizer


XXXVIII

Minha barreira não é a revelação
É a compreensão


XXXIX

Às vezes me sinto louco
Meu ser transborda neurose
Possivelmente, até um psicótico
Aí passa e resta um receio
Uma autocrítica bravia
Alguns escrúpulos piegas
De um projeto de homo-sapien equivocado
Meu olhar parado inspira demência
E ativo é indiagnosticável

23h49min
Aqui jaz a poesia de hoje
(10/02/95)



XL

Tua lembrança vem a lume a cada instante de minha vida
Aquém pressupõe eu estar apaixonado
Levo uma vida de pressuposições
A minha inconstância é reles
Se for para duvidar do meu afã por ti
Preciso gostar de ser romântico
Minha Lua, minha luta, minha luz
Pequena cidade paradisíaca
XLI

FAÇO versos oscilantes
Que altercam momentos como alterco emoções
Emoções animais, emoções
Alunos não são pacientes
É mais fácil ser experimento
Perdendo a meada do que se tem a dizer
A poesia te afinha, tem uma existência rebelde
E não há de se submeter.


XLI

Se teus versos dizem “pare”, pare
Se te iludes sofrerás danos irreversíveis
Deixa teus versos serem pagãos
E porem fim à própria existência
Aja como se subsistisse sendo representado
Assim eles te fitarão com respeito
Ao autografares estabelecerás a última palavra.


XLII

Meu nome é a qualificação do que escrevo
Meu ser é seu total temperamento
Um ser e um nome comportam as existências
Meu nome, meu ser e ela são os sentidos de minha existência.
(11/02/95)



FIM

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