FABIANO SANTOS SOUSA
ESTRANHO POENTE!
PARTE UM
POEMAS
PEÇAS PRIMEIRAS
BEM-VINDO, OLHAR DE DESPREZO
RECEBO-TE COM RECÍPROCA VILEZA
AJUNTA-TE AOS HÓSPEDES DO MEU SEMBLANTE
E NO CASTELO VASTO DO UNIVERSO EU VIVO
ILUSÕES DE UM PEREGRINO
Não só faço o que quero
Porque não só quero o que eu posso fazer
Faço o que devo, faço o que faço
E não nego
Embora fosse fácil
Deixar de fazer o que eu faço
E fazer o que não devo
Inerte em uma brisa parada
Numa cidade fugaz
Do lado de dentro, ou do de fora
Desta ou daquela porta
Já nem mais importa
Não estou aqui porque quero
Tampouco quero por estar
Somente estou e não nego
Sinto esse estado passar
Não me iludo
Sei que ainda hei de voltar
Deixo-me ir
Sem olhar para trás
Sem bagagens
E sem ouvir a vontade
Até a vista
Pode soar como adeus
CONCRETAS FICÇÕES
À Luciene
“Cabelos louros encaracolados;
pequenino sinal gracioso sob o queixo,
unhas curtas sem pintura,
olhos radiantemente verdes;
cerca de um metro e setenta;
um oceano de curvas;
gratos movimentos leves,
o mais deslumbrante sorriso
e tomo por item final da descrição
o namorado”
MISTÉRIO NOS OLHOS
À mesma
Não bastaria ser tão bela para assim me ter
É preciso pouco mais do que isso
E algo menos do que a beleza que compõe os sonhos
Algo como a beleza de Luciene
De que valeria tão linda silhueta,
o olhar tão vívido,
o delicado semblante,
o calor irradiado,
a essência feminina absoluta
que conduzem os corações mais ferozes ao declínio?
Apenas inspirariam, (e inspiram), à poesia
mas definitivamente não rendem
Ainda não
É só quando o apogeu da arte se revela
na trepidante intensidade das emoções,
na simplicidade contagiante das alegrias,
na humanidade pungente,
vestindo-se enfim na glória de tua beleza,
aí sim, me acerca,
rende-me
e me faz arder em paixão,
ser a ponte sobre os espinhos em teu caminho
incendiar-me para espantar as sombras do teu percurso
esvaecer até perder-me desde que sorrias
O QUE PAIRA
O que paira é algo menor
do que o que desejei
não é dor infante
melancolia suprema
completa cegueira
total paralisia
O que paira despiu-se dos medos
das dúvidas
inércias
lamentações por velhos fins
e novos começos
sinto-lhe as forças e os pesares
retém minhas lágrimas
nem bem, nem mal
porque o que paira
(e paira)
é a morte
MORRER
Sem dizer ‘morri’, morrer
Assusta os sentidos?
Dizendo: ‘morrerei’, morrer
Consola?
Todos morrem um dia
Morrer é solitária aventura
Assim como viver
Em si ou além
Delimitar inocências e frustrações
Enfim,
Morrer
NOVA SÍNTESE
Nossa vida atroz não quer
sentidos, princípios
semelhanças e diferenças
Vãos medos e meras expectativas
Nossa vida atroz só quer
viventes
OS MAIS BELOS OLHOS JÁ VISTOS
À Cássia Aparecida Elias
À primeira vista são os olhos que lhe atordoam
Logo ele a ama; precisa diariamente daquele olhar
Ele é ingênuo. Crê na amizade
Ela é tão bonita! Beleza que tanto preenche
Mas nunca sacia
Ele investiga; pouco a pouco a descobre
Sonha intensamente
Perde-se do tempo
Perde tempo
Ela se entrega
E ele sofre porque é a outro
Humilhado, ele desaba
Mas logo se ergue, perdoa
Ela se solta
Ele desperta
O tempo passa, nada acontece
Ele receia, não se atreve
Ela não liga
E se entrega novamente
A outro novamente
E mais sofrimento ele aceita
Sofrimento maior pela amizade...
Toda esperança se desvirtua
O respeito se afasta
A consideração satiriza-lhe
E só graças à amizade
Ele não morre
Ela já sabe, não há dúvida
E não liga, não precisa
Já que ele não tenta
Ela é cruel
E fere profundo
Diante de todos
Ela o mata
E ali ele a perde
Definitivamente
Bela amizade
Não se explica
Faz a sua parte sem admitir
Fênix
Tão certo quanto fato
Do prazer da conquista abdica
O tempo vai e leva
A ÚLTIMA IMAGEM DE UM SONHO
À PAULA
Pare, olhe, escute
Não finja que sabe de tudo o que vou dizer
Seja boa. Você é
Seja ouvinte. Você é
Seja fria. Você é?
Sentimentos que outrora se omitiram
Ocultos estavam em mim, como joios escondidos
Hoje me põe à par a grandeza de algum deus
Que o passado importou pouco até você ter acontecido
Exaltei imensamente a perfeição da tua forma
O teu carisma, teus segredos nítidos
E se meu sentimento se exprimisse com palavras
Trar-me-iam a exatidão pra descrever teus olhos negros
Tenho medos. Você vê
Tenho sonhos. Você sente
Os pés no chão. Você Crê?
E uma razão que a você mente
Revelo-me a ti. Digo tudo
Tenho-te perto; te amo mudo
Vou partir. Nada mais importa
Vou te perder sem sofrer
Sem ilusões e sem dor
Até se esvair minh’alma
Não há fé que compreenda o limite desse amor
Não se resigne. Você pensa
Posicione-se lentamente
Confunda-se agora ou parto para sempre
De qualquer forma
Obrigado amor, obrigado Ana
Meus atos mentem, meu peito ama
Se meu ser se engana, morte me chama
Deixo-te amor, te adoro Ana
A TRAGÉDIA DO SÉCULO
A tragédia do século
Milhares de pessoas morrem
Em Ruanda
Homens, mulheres, velhos, crianças
Cerca de 400 diariamente
De doenças e de fome
E incineradas em campos minados
Lá vive morto o sentido da existência
Não são pessoas, mas números
Números rápidos de estatísticas
É longe. É outro país
Tragédia na terça parte
Do mundo mutilado pelo mundo
Chegarão fácil a um milhão
Homens, mulheres, velhos e crianças
Corpos inertes espalhados por todos os lados
Outros provados em seus pontos de agonia
Sem tempo para sepulturas
Ou para dar atenção aos que sofrem
Homens velhos, mulheres crianças
A vida irremediavelmente se esvaindo
Ainda sonham ser
A força do amanhã
Deformaram-se os olhos, o crânio
Fatídicas vítimas da desnutrição
Gerando imagens impactantes
Transformadas pela vista em aberrações
Mas são crianças, mulheres,
Poucos velhos, pois envelhecer é um privilégio
Homens
Presente dos homens
LÁGRIMAS PERDIDAS
Não quero ninguém no meu enterro
Se necessário, apenas quem me enterre
E quem me leve à terra
Nunca gostei de enterros
Nem de qualquer cerimônia fúnebre
Não considero importantes as lágrimas
Que esvaecidas carcaças banham
Talvez só que rezem
Ao Pai que acolhe
(espero que acolha)
E que liberta
À liberdade maior
Da qual só o espaço
Intransponível
É infinito
As almas são vários infinitos
Que se intercruzam em seu “sem-limites”
Absolvidos meus filhos e filhas
Irmãos, amigos, parentes
Esposa, mãe, enfim, todos
Deixar-me-ão nas entranhas da terra
Aos seus milenares cuidados
E não desperdicem mais suas dores com a matéria
Amem-me póstumo como e se quiserem
E basta
A MEU PAI E A MINHA IRMÃ
Cuidarás d’ Alessandra
E lhe dirás que a amo
Assim como também a amas
Assim como amo o sol
As nuvens e a vida
E cuidarás melhor de ti
BRINQUEDOS MORTAIS
Olá, criança! Como vais?
O que sentes, ó benção divina de teus pais?
Trazes mesmo contigo esse brilho que me chama a atenção,
Ou meus olhos que te enxergam são escravos do coração?
Estás frígida comigo, não entendo
Negas? Não sinto, estou vendo
Não digas que nunca gostaste de mim; sou mudo e surdo
Se por nada passamos, qual impávido mortal te arrebataria tudo?
Estás brincando, sorrindo
Não mentindo; fingindo
E quanto mais esfuziante
Tratas por menos importante
Quase como criminosos a fugirem em debandada
Jogadores errantes, incompatíveis amantes em distintas estradas
As armas do jogo: escudos, espadas, persuasão e beleza
E novamente o cavaleiro cai aos pés da princesa
Não digas mais nada, encontrei a resposta
Indicando a saída, vira-me as costas
Eu sei não me amas, mas o melhor queres pra mim
E para essa história melhor qual seria tal fim?
Das hipócritas crenças abjurei para o meu bem
E tua ajuda foi muito importante também
Mas se não me amas, a face não me vires assim
Pois se sofro, agüento, mas se a dor for em ti doerá mais em mim
PRISÃO DO ESPÍRITO
Sinto que estou velho
Para escrever poesia
Por quase sempre me esquecer
De deixar transparecer
A mínima sensação de alegria
Passos dados no escuro
Dor atroz na prisão do espírito
Obras que envelheceram uma vida
Permanecem vivas
Sinto que estou pobre
Para interpretar poesia
E para entender Fernando Pessoa
Contemplar a imensidão sem pensar numa mulher
Brilho puro no escuro
Braços estendidos, tato feito visão
Sentinelas da fantasia versus medo
Vou fechar os olhos para ver o que eu quiser
Vou pisar em flores
Que embelezam jardins
Venha a verdadeira beleza
Pisar em cima de mim
Sinto que nada sinto
Pra dizer em poesia
Por nunca amar e perder
Todo o bem que me faria
ARMAS FEITAS DE MÚSICA
Choram notas melancólicas
Ecoando pretensiosamente mais do que outras
Filhas todas do instrumento mesmo
Têm trágico fim dissolvendo-se no ar
Todavia, sagazes dissimulam
Para acolhidas serem pelo resignado espírito
Desvanecendo no físico espaço
Perpetuarem da mente no infinito
Dia após dia permanecem
Reverberando mudas e deslembradas
Até se juntarem em colóquio
Conjurando ferirem a memória
Feliz de quem se guarda
Da sedução capciosa dessas notas hipócritas
Valorizando o sentir do artista
Sabendo desconfiar da arte
ESTADO DE ESPÍRITO
Estou vivo;
Porque respiro e instintivo induzo minhas funções vitais
Porque minto quando omito a dor que sinto com um riso que ao mundo satisfaz
Se ao menos eu pudesse lavar a minh’alma com estas lágrimas que não derramo...
Estou vivo
Porque te amo
Estou preso;
Torturado pela impiedade de que me alimento, pela sina que sustento e para quê?
Para o olhar cego me conduzir, certo de onde ir e com nada mais a fazer
Se ao menos eu pudesse acreditar que nossos olhares não se cruzaram por engano...
Estou preso
Porque te amo
Estou só;
Porque se sempre tive a mim mesmo, perco-me agora para ti
O sonho e a mentira ávida pelo perdão sem redimir
Mas, se ao menos eu pudesse te atrair quando te chamo...
Estou só
Porque te amo
Estou fraco;
Espremido pelo tempo que dispõe de tanto tempo para me martirizar
Levado pelo vento que sarcástico canta lento sua intenção de me sufocar
Ainda se ao menos fosse um bravo cantando vitórias pelo meu amor que proclamo
Estou fraco
Porque te amo
Estou louco;
Pois não creio, não contesto, não entendo, apenas sinto
E sem sentido tão grande amor fez insano o meu instinto
Ah! Se ao menos um distúrbio me fizesse acreditar que ficar juntos ainda vamos...
Estou louco
Porque te amo
Estou morto;
Por ver como luz no fim do túnel a sempre última cartada
E ao concluir que sentir dor é pior do que sentir nada
Que o meu tempo para esperar-te seja o não passar dos anos
Estou morto
Por que te amo?
(ESTOU LIVRE?)
CANTO SIMPLÓRIO
Verdades escondidas
Na afinidade de um simples amor
Um amor brilhante d’onde fluem límpidas
Pelas luzes brandas de um sol poente
Mas não querem nada os que querem sombras
Como mais do que orvalho, os que querem chuva
As porções livres além da verdade
É o vigor que esse amor segmenta
Os opositores de tal verdade são determinantes
De não serem restritos à palavra dúbia
Se batem contra a forte-grande-tecnologia
Ou se contra os meigos passarinhos
Tão tenaz amor não se intimida
Seu corpo, apenas vida, seu ser apenas ser
O espírito esquece, jamais despede
Pois dele só vai remir o perdão
Para perder-se a vida, perde-se a memória
Tempo de vitória não se condiciona
Habita a esperança todos os corações
Até o último degrau do medo
O fim que trago é um mais do mesmo
Permanece a esmo e não cansará
Outrossim, seria qualquer sentido
De explicar, cantar ou do amor esclarecer
Sua única verdade
UMA QUASE ALEGRIA
Natureza livre
Uma “quase-aleria” é ter a natureza livre
Autônoma e autodidata
Mas o meu interesse é irreal
Perder-me do domínio da dor
E deixar escapar o controle
Do dom de sorrir
São exclusivos sintomas
De tal conceito de liberdade
Natureza livre
Ainda uma grã-tristeza é merecê-la
Só que nada se merece porque tudo se conquista
Esta visão era-me oclusa
No tempo em que eu temia passar diante de cemitérios
Embora ir para lá não temesse
Também enfatizava a figura do bandido
Se bem que bom por demais seria...
Natureza livre
Processo complexo de libertação da vontade sintomática
Abrangendo espírito, instinto, impulsos
Comandos de um lado esconso do cérebro
O lado mais sensível
Os maiores embustes
A força e a convalescência
Parte dois
LIVRO
SATÍRICO
DIVERGENTE
Eufóricos e pedantes
Airosa, juventude brava!
Elucidando convicção
Aprontar não sabe feijão
Mas cumpriu que chegava
Vitalícia segurança
Certeza própria e não branda
Tola por natureza anda
Presa da ignorância
Destituem presidência
Estampam a moralidade
Utópica na verdade
O elixir da inocência
A força expelida adiante
Cega-lhe mutuamente
Alheia a sua frente
A mídia ser tratante
Deglute farta mentira
Crente experimentar verdade
A capa a qual vestira
Às costas mais pesa e arde
Basta por suficiência
A fama a que se dara
E a tinta que pôs na cara
Foi só a inconsciência
SENSO NATURAL
Vale mais pele que a carne cubra
Do que nobre vida que inerte viva
A fonte esplêndida atraente
Desde os primórdios apreensiva
A energia estupefata
A inteligência tão resumida
A força árdua que lhes tira a sombra
É a força árdua que lhes atira à vida
Em mito a deusa tecnobeleza
Ai dos homens sem a Natureza
A PSICOLOGIA DA EMOÇÃO
Uma canção de amor à Lua
Sol que será símbolo na escuridão vasta de ser e saber
Os olhos são o que tenho de bom
Embora corruptores do coração
Sem coração nada sou
Menos importante do que qualquer outro ser
O pouco purismo das grandezas pífias
Maior do que grandezas iguais (filosóficas)
Vaidade pré-concebida
A exaltação sempre desmedida
Psicologia delimitada
Atraente em nada
DETURPADAS IMAGENS D’AMOR
Falar amor é falar: “amor”
Sentir amor é sentir falar: “amor”
Viver amor é viver sentindo o falar: “amor”
Agora morrer de amor é morrer
Igual a qualquer igual
E deixar o amor
BEM VINDO AO MUNDO DAS ESTÁTUAS
A vida está parada
O homem está parado
Eis que surge a mulher
Parada em qualquer outro local
As ondas estão paradas
As sombras estão paradas
Crianças estão paradas
Nas vitrines das lojas de doces
Onde a mosca está parada
E a aranha está armada
Não querendo, mas morrendo
Parada
A Lua está parada
As estrelas, paradas
Como todo o universo
Os arranha-céus estão parados
Bicicletas, motocicletas e limusines
Paradas
As indústrias estão paradas
Inertes, os peixes, pássaros, demais seres
Ridiculamente parados
A reprodução inexiste, embora uma fonte de amor
Emane de outro lugar
Mas, mesmo o amor parece estar
Dispersa mente parado
Por em lugar nenhum haver
Um ponto em que não vigore
Algo imovelmente parado
A brisa está parada
As guerras estão paradas
E a cobiça
E a veemência
As grávidas estão paradas
Os velhos estão parados
Esperando para atravessarem a rua
Na qual pálidos carros aborrecem
Parados
As escolas estão tão paradas
Quanto a violência
A inteligência é quase invisível
O instinto, parado, paira no ar
Parado
E eu aqui parado, vendo intrigante semelhança
Oh, meu Deus!
Eles não têm almas...
A-QUI-ME-DE-COM-PO-NHO
Sou cacto
Um porco-espinho
Um ouriço do mar
A face da caveira
Em símbolo
Viril e consciente
Sou as pedras mortas
Imortais
Vejo-me um ponto no universo
O espaço e as galáxias de todos os meus ‘sois’
Uma vontade que não sou eu
Mas coligação de mim
Sou um espaço infinito entre dois pontos
Superstições
Sou o peso desigual
Na balança da vida
A encarnação
De tudo o que inexiste
Sou um fantoche
Nas mãos da poesia
Algum qualquer sentido
Tristeza...
A própria Lua se torna fúnebre
Banhada no luto da noite
Vejo o mar apaziguando e separando pós
Que não se misturam
A deriva em seu ciclo
Netos e filhos
Ou pais, irmãos e amigos
Grandeza tamanha não cabível aos olhos
De vidro perecível, mas a qualquer
Que seja eterno
As faces assombradas
Em sua subconsciência
De um tempo soturno
Tingindo a inocência
Tudo o que me fere
Como orvalho gélido nos lábios
Da mulher encantada de muitos sonhos
Que sorri em sua sede pelo amor interrompida
Que independente se transfigura
É-me tudo tão frio
Tão firme
Tenho uma luva calçada no coração
Sou um ímpeto que jaz a cada instante
Num circuito de estranha coerência
Um universo em mim mesmo
TENHO A FACE SEM FEIÇÕES
Tenho a face sem feições
Posso sorrir, mas não posso chorar
Não quero ir dormir mais cedo
Para empurrar angústias alheias
Vejo a brevidade de minha vida
E minhas ilusões se dissiparem
Só não receio por minha importância
E nem pelo temor do mar
O mar que tudo sabe
Mesmo sem seus deuses mitológicos
E já sem os restos que abraçou
Banhado em espírito
Dos homens e da Lua
Tenho a face sem feições
Posso sorrir, mas não quero chorar
Não posso ir sempre dormir mais cedo
E deixar para trás angústias alheias
MEU PAI
Meu pai humano perdi há muito
Há anos esquecidos
E hoje ele se foi
Deixando-me a perda
De um irmão em meu Pai
Do céu
SIMBOLISMO
Abra-me os olhos, soturno
É preciso que meus ares cubram-se de luto
Enquanto guardo minh’alma
E vivencio meus frutos
O que vejo em mim
É coragem que não me dão
Tão bom é acomodar-me em um abraço amigo
Com a dor que consigo em interpretação
O que passa traz um gesto
Como um maquinal ‘boa noite’
E todo gesto há de ser símbolo
Maior do que o símbolo da própria morte
Cadáveres são símbolos
Mesmo o sentimento de perda
Ambições e estimações
Minha direita, minha esquerda
Símbolos, nada além de símbolos
Deve-nos ser simbólica a amizade
A vida a que emprestamos
E todo amor de verdade
O MONTE
Lua
Lua cheia
Nova
Velha
Jaz
Sobre o monte em que brota a vida sem sentido
Testemunha de um rei
Símbolo de cada plebeu
Fardos da fonte
Guardados no rubro
Ocultos no medo místico
Distinguindo as pedras
Zelando por epidemias
Movendo-se imperceptivelmente
Como um oceano azul
Lua
Lua gélida
Branda
Linda
Luzente
Para um monte em que a vida jaz
LEMBRANÇA
♪Quero a valer
Agora surpreender
E entre irônico cantar
De um amor lembrar♫
Em meu ser
Que me tem satírico
Que me tem romântico
Que me tem físico
E espírito
Deslumbrante
Vão
Aquele com que aquém duelo
Aquele com que aquém amo
Que minha espécie contempla ao longe
Que cria um arco-íris aos meus olhos
Que navega em meu coração
SEREI SIMPLES E DIRETO
Serei simples e direto
Ainda que pela última vez
Pesa esquecer-me dos conflitos tão interiores
E projetar-me na civilização
Algo além da civilização veemente
Agitando-se sempre em mim
Sair dos males que me consomem
Até os males que me despedem (e dispersam)
Quais se me têm, não melhor me terão
Na espaçonave de meus olhos
Eu, a me distrair em outros planetas
Até o tempo de retornar às justas
Saúdo, pois, o fingidor
Não a pessoa, mas a pessoa que não era
E que me inspirou a escrever este livro
Que vislumbro como cristal a obra
Ou muito de sua consciência
(coerência e incoerência)
Mentalizo, todavia, minha própria complexidade
Sem difusões
Pois seria um homicida de muitos ‘eus’
E beiraria ao risco, à ameaça
Meu único civil
Não há fugas para mim
Ou para outro
Desvirtuar não é lícito
E a lei acontece
O futuro é a lei
Com uma sentença a cada segundo
Nada lhe foge
Porque é nada
Algo único
Único algo que inexiste
Então somos todos do futuro
Até sermos nada
Aquém
PEDRA DE ESPUMA
Sou agressivo
Sou óbvio, mas inteligente
Sensato, mas complicado
Exuberante
Sou frívolo, sou mesquinho
Hipocondríaco
Conscientizador
Profético de coisas não coligadas a mim
Sou romântico beirando à loucura
Minha loucura é a insensatez
Sou um escravo do desejo
E não sou poeta
Sou sensível
Total e somente emocional
Sou poeta
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