FABIANO SANTOS SOUSA
TRANSIÇÕES
ANÁLOGAS
E
PARADOXAIS
POEMAS
2008/2011
OU
OOOX
aos meus filhos, Lara, Leo e Ale
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SINESTESIA
Piretrinas e piretróides
fenômenos da química
faustosos sons sem melodia
a hilaridade e a agonia
se na verdade vísseis que o vosso mundo
é o mundo dos insetos
saudaríeis todos os sons sem fobia
e a ciência o consagraria
os homens todos seriam doutores da Ciência
dos insetos seriam os cientistas
guiando deuses à harmonia
respeito, em suma, a fisionomia
09-12-2009
TEU MOMENTO
Enquanto passa
o tempo de tudo o que eu tenho
tudo eu trocaria
por tempo
todo o tempo
te daria
pois fazes
parar meu tempo
e eterno eu
seria
Sendo algo
que rompe o instante,
meu escudo
de esperança,
meu declínio
sem sinal, descontrole perfeito
saltando à
vista e ao vento
o teu poder
cintilante de gerar poesia
Não sei o
que é, amor, mas atento
que jamais
poderá ser menor ou pouco
não há como
ser, chegar,caber
sem medir
com o tempo, conceber
e não sendo
amor, amor, não é menos
23-01-2008
ESPONTÂNEA
Do teu perfume, um jardim imenso
propagou-se dentro de mim
e no meio dele teu olhar de brilhantes
cravou-se, tesouro sem fim
chamei de teu amor o tesouro
nasceu, então o sol do teu sorriso
e o céu de teus lábios abriu-se
meu próprio jardim-paraíso
23/01/2008
QUASE SIMPLES
Ah, como poderia dizer-te tudo o que sinto
sem invadir furtivamente o teu mundo
sem iluminar o teu abismo?
Que honraria é coragem onde a guerra é um mito?
Não é vencer sem lutar sua arte?*
O que eu sinto por ti é o segredo
A própria fronteira do infinito
secionar a distância é encurtá-la
e multiplicá-la
Figurar é deixar de sentir
Descrever é induzir
De ti me vem a inspiração,
mas sem a plausível tradução
e só se de tudo o que eu não pudesse te dissesse,
verdadeiramente pleno seria
24/01/08
*(Sun Tzu – “A arte da guerra”)
SOBRE MINHAS ESPERANÇAS MOVEM-SE TEUS PÉS
Sobre minhas esperanças movem-se os teus pés
Sempre te encontro onde te busco, embora não sejas sempre a mesma
Reconheço, sentindo, teu fluxo e endereço
Sob teus pés, cristalinos, meus sentidos te refletem
Quis dar-te singela fina cena descritiva
‘inda que a alusão extrapolasse nossa Física
lidando e sabendo que com valente mero subterfúgio
pois o que sei é simples, a verdade é simples
A verdade é um véu soberano ao vento
Sobre minha memória procede tua lembrança
Que ainda que me parasse o coração, conservaria o sorriso
E só assim te vejo em verso e música
Tanto mais te desejo autônomo da virtude
E se estiveras alheia, eis-me...
25,26 e 27/01/2008
CICLO DA VIDA
Perfilados e tristes ao imo de um vão
meus versos vão
ecoar em vão
e o afã que me resta reparte o pão
com a solidão
da alienação
do cansar calado irrompe inanição
prima lassidão
murcha o coração
vem o Amor e à dança me arrasta pela mão
já sem solução
ia dizer não
quando arrebatado sinto sua canção
nos versos e no refrão
os ecos estão
09-09-2008
CERTEZA
No régio e abissal paço da Beleza
com a chuva colorindo o pano da existência
reluz a alma de tudo em uma só essência
do sopro lírico de Deus vem a Natureza
Ou se o céu fulgurar numa aurora acesa
ofuscando a face austera da Ciência
aprazível a um singelo olhar de sapiência
que a compreender transcende em grata surpresa
Há um tênue véu sobre qualquer certeza
Algoz da ignorância, pai da inocência
Matéria da dúvida e da clareza
no tangir dos sonhos fere a
intransigência
tal pão a poesia em postas sobre a mesa
a nutrir nossas simples e sensíveis tendências
21/09/2008
SINESTESIA II
Com freqüência não está
meu estado de espírito
por vezes vem como uma nuvem
nublando os ares que me rodeiam
ou como uma festa
impulsionando o ânimo
com luzes, cores e musicalidade
ou como uma bomba
propagando impassivelmente
dores e rancores
Não importa o quanto de mim não exista
meu proporcional vácuo, minha antimatéria
tudo eu sinto
em vários surtos de emoção revolvo
pressinto a ausência
o seu merecimento
a ordem, a energia
tentando lidar com a inexistência
perseguindo o tempo em seu infinito
mas em algum lugar-nenhum como substância
vagueio
nos caminhos do passado presente futuro
01/10/2008
ANDEJO
Pela manhã despertei com um grito
quis, mas não pude saber de onde vinha
se de longe, ou de perto, ou de nunca
tão alto quanto suplicante
Passei todo o dia procurando
e sei que muitas coisas descobri
mas a noite impaciente foi chegando
e o vento foi levando o que perdi
É. Algumas vezes eu pensei em desistir
esquecer de tudo, cada porção do dia
se o encontrasse, talvez nunca compreendesse aquele grito
o que há é um instinto escravo de um apelo?
Verdadeiramente, para onde vão os gritos?
Além de onde os olhares se extinguem se distinguem
em forma de ecos a madrugada trouxe
de volta ao meu quarto meu próprio grito
EXEQÜÍVEL
Reconheci-me
ainda que meio morto em minhas evasivas
de etérea
forma no “way of life”
e invólucro fosco adquirido
Na surpresa sem saudosismo
e no pulso do impulso me encaminho
rumo ao inatingível
contra o intangível
Sei, morri um pouco a cada espaço entre os minutos
concentro agora em meus punhos
o fluido da vida de encontro a toda negação absoluta
ressurjo mais jovem do que o vício
menos incisivo
simples e digno
a pronto serviço
17/08/09
RESÍDUOS
As vozes que o silêncio traz
entre os sussurros do vento e os contornos
que figuram as árvores em suas copas
a altiva expressão das flores
em suas cores
o ondular inebriante dos lagos tranqüilos
distorcendo o reflexo, reverberando o espírito
peças tantas de mim
entre as partes todas que atino
a contemplação de um segredo
que a questionar os anos não se atreveram...
Mas nem só de resíduos sob os pés me insiro
ou refuto em abrir alas ao deus do impossível
deixa-me cada distração livre divertido
e ter-me cada percalço aquém mais destemido
21-08-09
SINESTESIA III
Quisera, de súbito e impetuosamente,
meu abismo louco devorar tua figura
preencheu-se-lhe, armadilha inesperada
extrapolou cada item de matéria
teus sons e teus detalhes sitiaram-me a memória
tu, diva visual
eu, reles homem sinestésico
apercebemo-nos instrumentos de saudação à vida
21-08-09
FARSISTA
Perigosos fluxos eqüidistantes
de valentia e indecisão
nos andares primeiros do céu
os impulsivos incitarão
E por dizer a verdade
entornará dúbio valor
o conceito humilde e sereno
real até onde for
mas tal como a fé
a concepção do amor, o conhecimento
prezam e prima de novos andares
também o advento
injustificável, insubstituível
a vocação dos Ava tares
DIZER E OUVIR
Só quando findei por dizer tudo o que eu quis
conjecturei o que eu não disse
e era muito mais sincero
e mais simples
e perfeito
Será, entretanto, doravante, perdido
Houve seu momento propício
Ouve! Só o que eu disse...
Terá sido assim todo o sempre?
Omissão constante de tudo, sempre
De tudo, nada eu disse
então, o que disse?
É o que não está
Revela mas não contém
Transcendência divina
Amém
09-04-09
SEGUNDO DE ABRIL
Envolto, embrenhado nas perguntas e respostas
quase é possível distinguir o colapso
aceitar seu abraço
chamá-lo Futuro
Vou a qualquer canto com meu porto seguro
As perguntas me dão medo
Respostas não uso
Extraio do colapso um ponto fixo
Nexo que unifique presente-futuro
Emirjo, de súbito, com porto, com tudo
e tudo é turvo
agonias novas
rumo ao fim sem indagações
Ressurjo e já miro quiçá mais nítido
que do que necessito é o que quero
pelo receio contido
02/04/09
BIG BANG
D’um vago estar estranhamente firme
até um ímpeto sutil de júbilo e plenitude
Dos misteriosos tesouros da beleza surges
e tão sólidos quanto possível
trepidam os alicerces de todos os desejos
ODE CONTÍNUA
A crisálida rompesse
lutando pela utopia
esgueirando-se nas conspirações do mundo
algo novo nasceria
Estranho a princípio
quase invisível
como um sol translúcido
sem ardor terrível
De verdade latente
Por que não um deus?
Da fôrma da mente
direto aos seus
Tudo não elucidasse
mas não mentisse
o excesso apartasse
sem razão sorrisse
A autoridade de exercer
a capacidade de sonhar
a justiça sempre
o prazer de confiar
LEVANTE
Não escrevo para julgar o valor das coisas
Nem para valorizar o que escrevo
Escrevo para valer
Coisas sem valor
Expressões que mudam
Máscaras para o baile do mundo
Escrevo espontaneamente
Mais do que sorrio
LEVANTE II
Desbravando sombras almejo infernos
Em geral a beleza tateio e a lascívia esmiúço
O horror desprezo
A bondade não vejo
Tive tudo quase sem aviso
Também o medo do tanto que me disse respeito
Um relativo convívio com os meus juízos
E possivelmente até uma certa ajuda do invisível
Cruel e intolerante com o destino
Comprimindo assim os atos contínuos
Não me atina a graça do Paraíso
E nada supervalorizo
É só mais uma análise morta de meu tempo
Eu, fútil possessivo
Rumando ao infinito ausente de motivos
04-09-09
BENEFÍCIO
Saudade pungente de ti me agride
do fundo de minhas razões perdidas
com tênue e vã esperança colide
a propelir-me estilhaços por toda a vida
ânsia e desejo que veloz me incide
vê com saudade paixão tal nutrida
há que se amar ser a arte mais plena
todo pouco de ti ainda assim vale a pena
D’encontro à saudade indelével lembrança
lampejos efêmeros de mágicos instantes
transposta razão o que real alcança
tendo trás loucura e amor adiante?
Da coragem farto que ampara as crianças
por fitar pasmo fulgor radiante
s’inexitência traz vida e totalidade envenena
todo pouco de ti ‘inda assim vale a pena
aqui foco outro de saudade, tristeza
faz-se ausência vácuo de suplício e frio
detentor pretenso de enérgica beleza
porta sim fardo pesado e deveras vazio
tecidas como que somente de incerteza
vestes frágeis para conter inverno bravio
como palco ao ator e ao gladiador arena
pouco de ti ainda vale a pena
Valerá mesmo a pena tão breve lampejo
em jogo horas longas no ermo das noites e dos dias
sem contato, sem toque, sem calor, só desejo
um “big bang” no peito a
propelir poesia
e o afã pelo flerte que desperte um beijo
que a esperança pouca loucamente ampliaria?
Eis que plena, enfim, a felicidade me acena
Todo pouco de ti, oh sim, vale a pena
04-09-09
UNKNOWN
Pálido e alicaído cambaleando ia
impressão deixava de olhar que não via
e o que via vir de longe parecia
amenista, lentamente se movia
como seu destino
de razão inexplicável
e aura de inexaurível energia
reflexões atraía
ainda que jamais chegasse sempre existiria
por menos que interessasse quem alegre fosse
se não arrasta a alegria
pluraliza
se cansa e descansa
dá alertas e avisos
de celebrar não perde o nascer e findar dos dias.
Não o que ia
que mal se apercebia dos dias
e nem pela verdade se detia
responder não lhe custaria
posto que a todos chamados ouvia
mas não no mal ou bem cria
assim não se detia
daí a ingente tristeza
adrede a certeza de quem sumir podia
propalando-se a qualquer razia
10-09-2009
SINTOMÁTICA
O arrepender-se da sinceridade é um alerta
o descaso obstrui o sintoma da doença
não pensa a pressa mesmo quando acerta
a entrada larga é pra burrice imensa
Quão maior o correr mais atreio aperta
nada ou pouco inspira a austera crença
o ínfimo esforço a que tudo desconcerta
faz do julgo a força que lhe recompensa
O que são nesses rostos, marcas de nascença?
Não, não posso crer, mas horrenda oferta
quase irrecusável tais as mãos já abertas
No raro e gélido deslumbre da descoberta
da ciência quase sã segura em si se condensa
abrigo da tragédia e coragem intensa
10-09-2009
POLVOROSA
Vem o armistício do vento, do breu e do sismo
e um orgulho jacente que engole vivo
cessa o rutilar das estrelas e a borrasca
emposta sua sanha além do nevoeiro crasso
mas é tudo cincada, solecismo, bravata
a rusga não cederá à contumácia pusilânime
o agouro é perene e depostos os gládios
insurge do aeon lisura ou
aleivosia
Eis a transcendência das Eras e dos Gêneros
a desconstrução e a manufatura dos caracteres
de onde punge a volúpia e aterra o zênite
prorrompem os lábaros plantados na História.
11-09-2009
POR
FÁS E POR NEFÁS
Por fás a palavra persigo
Por nefás não pondero o que digo
Que não fosse a pressa o meu legado
Não houvesse o verbo às sombras beijado
Se tapei com a luz o breu do mundo
Negado foi-me e justo o repouso oriundo
Reclamo sempre a nobreza
Não me deixa a volúpia a mesa
Ponderei além da visão
Até a massa dos desejos e a solidão
O que advir dos opostos
É só ego o que não tem rosto
Colidam os valores por fás
Sempre amores e dores por nefás.
12-09-2009
IDÉIA
A razão está no céu e não no chão em que piso
e disso são meus passos exemplos vivos
sem fartar de ouro e jóias em minha algibeira
serei feliz também a plantar bananeira?
Idéias são como estrelas resplandecendo na razão
que em si só é só vácuo, mera indistinção
fundamenta-se-lhe sistemática a analogia
em ápice pleno, tal a vida, gera alegria
mas ainda que qual efêmera também propagada
elixir-essência d’alma produzida
um sabor que o mutar do mundo impulsiona
outrossim, aos muitos que se não disse nada
luz de remota idéia, grandeza subentendida
quais mundos novos não trará à tona?
12-09-2009
PRONTIDÃO
Vede ó musa, eis meu abandono
apartei-me da chama, elidi sua virtude
só a lassidão me sobeja o torno
jaz-me no ergástulo cupidez e atitude
como se próprio fosse viva enxovia
da paixão de toda vida que o verbo sorvia
visse desgarrar-se símile refreada
e além do arroubo da morte restasse nada
Reportam, anais, isenção à justa
naipe da insídia em poluta fortuna
destino insólito do mundo à rota?
Vinde, ó musa, e ai do que me assusta
eu de novo impávido dicaz turuna
refulgindo o fulgor que vossa ausência embota
22-09-209
SAUDAÇÃO
Bem vindo, amor, à maturidade
tão bravo resististe ao trotar do tempo
e olha que tremeste muito e com vontade
e deveras duvidaste de um findar tão limpo
Mas não pouse, amor, senão te engaiolam
nem tanto repouse ou te ultrapassam
afronta as lâminas dos que as amolam
e menos fuja senão te laçam
Como hás de perpetrar intrincada artimanha
indaga-se-te num arroubo intermitente
se a altivez quer ser efêmera e a natureza, tacanha
também ágil a arrebatar-te a mente
defrontarás a resposta com clareza tamanha
é grandeza, amor, do insondável vertente
22 e 24-09-2009
MOMENTO
Eis-me, pois, semi-destruído
de projeto nenhum a valer concluído
além de traços comuns que me orbitam
só vozes roucas que a balbúrdia gritam
de tênue visão e coração pedante
com um pé já no abismo e outro avante
na abastada equipagem inatos defeitos
lavrando sonhos nulos de efeitos
traidor da esperança efetivo impaciente
apartado da fé em ação displicente
vivaz contemplador de vigor atrofiado
sitiador severo do próprio Estado
sincero inutilmente, probo em demasia
festim de tristeza no cear da poesia
do caos servil ávido pro testemunhar
honradez e brio no otimismo a incitar
24-09-2009
TRANSIÇÕES
ANÁLOGAS E PARADOXAIS
O que esperam que se sintetize incongruentes vozes?
Por que não se cansam a concluir inútil?
Por quem não se resignam com honradez à derrota
e exauridas assim não assumem loucura?
Faltam surtos muitos a se dar aos inventores
ou faltam inventores e o fruto é a utopia?
Destas interrogações só a retórica apresento
é ela quem apetece a voracidade das obrigações
e é o fingir seu alimento
Não combinam vozes, ou surtos, ou nuvens
Extraio do que olho outra essência em palavras
mas não posso garantir que sente o que dizem
como não vejo o que olho
E daí que se insinuem claras e destinadas?
Não lampejam estrelas que imemorialmente não são?
Quero depor, pois bem, a intransigência
Os defeitos morais são voluntariosos, mas a escravidão dos homens é
consciente
e não bastam, nem nunca bastariam as vozes
Seja talvez e quase ao certo daí a incongruência
mas, o inteligível saltemos
despeje-se-nos da rede do óbvio ululante
O que não aponto não quero que seja visto?
Trago a ânsia clara pelo sentido atribuindo-se-lhe sentido
e assim, feliz enfim, desisto
mas vindes vozes-surtos e ornamentam o impossível
e tornam agourentas as reais vozes
do silêncio e da chuva
e de meu próprio espírito
Para enfadar-me do cansaço não durmo
a tristeza é som e a alegria, luz
distorções e encantos que no tempo se fundem
e que a beleza transporta num largo sorriso
Na paixão tenho tudo
ferramentas, posses, armas, munições
e mais a ânsia, o afã
sou um rei num reino onde não me nutro
Há quanto tempo minha visão não abrange o fluxo do mar
e reconhecendo a perfeição de seu rigor não descanso?
O que tenho a devolver, em reverência
à sincronia celestial do universo?
Vejo-me enrijecer gélido
como o medo dos insensíveis
às vezes me procuro
e há orgulho ou desdém
seguir ou recuar quase não me consolam
Onde me levará tudo isso?
Sois vozes lapidadas
Redeadas com a inspiração
Pois para onde quer que eu fuja, tudo pulsa
Toda matéria a profecia transfixa
Não há mais respostas no que eu já conheço
Não me perco se não fixar endereço
Algo se oculta nos sentimentos
é um fardo cansativo o equilíbrio
filosofia é a extração
da essência
valor só combina com
merecimento
Aí vem o inferno
e ele é só a razão que leva tudo
serão da morte as vozes
assim austeras, mas não atrozes?
Já sei que me abandono
nas páginas e páginas das circunvagações
e traçam linhas tão simples que desenham um coração
que saudade das árvores, grandes amigas...
Com elas compartilhei a arte de ser simples
A vida que por si resiste
sem a tirania e a melancolia do equilíbrio
Aranhas das moscas, eu as abençôo
comporto mas não confundo suas teias e minhas raízes
com sangue bebem orgulho e eu luz e orvalho
inspiramos o respeito que destila os sentimentos
E como se a felicidade fosse o sussurrar de um segredo
Firmaremos sempre no solo todos os nossos dedos
Mas antes que eu deseje, desencontro
próxima a conquista,
finda-se o interesse
Não é plenamente sincera a honestidade do adeus
Toda personalidade é dupla
metas são pendências e inclinações
Viver são transições
Preparei meu espírito par um novo tempo
preparei-o para o dilúvio
entendi que é impossível e desnecessário
reciclar tudo
onde o advento vence
a inteligência racional fracassaria
quando ao tempo a razão se funde
instantes concebem tudo o que existe
Assim, vozes, expressões de sonho
não vos deteis tal as circunvagações do mundo
deitei-me a vossa margem
transbordai sobre meu eu adormecido
se fôreis vento, carregai-me
pois a morte é a última surpresa deste mundo
sempre é tempo de se rever as coisas simples
confiar no sobrenatural
penetrar na natureza
reconhecer-se
quem dera, vozes, tivésseis rosto
como a música tivesse gosto
as dores tivessem forma
os astros tivessem vida
pro tempo houvesse passagem
poltronas e janelas à vontade
a alegria fosse um ofício
os fortes corressem os riscos
espelhos nos censurassem
a vida restasse
Clareza dos sábios, inspiração das artes
Poesia dos amantes
Transcendência divina, o tempo exato do êxtase
Meu estímulo ao macrocosmo
nem duvido, nem desisto
apenas ouço
o que meus próprios poros sintetizam
aglomero sombras
espalhá-las-ei no próximo eclipse
10-12-2009
A
FONTE
Tens a beleza na qual me abandono
Quão feliz me entregaria...
Mas resto nômade, aflito, sem dono
De rejeitada poesia
Tens o fascínio em que me desgoverno
E que ardor formenta!...
Mas vens ausente rojar-me o inverno
Negar-me o efúgio da tormenta
Tens os rostos possíveis de minha alegria
E nos castelos todos de meus sonhos, trono
Mas só te apartas, me levando o sono
És a fonte do amor que me sustenta
Universo em que orbito num vagar eterno
Até o paraíso ou o inferno...
25-11-09
AMOR PARA SEMPRE
Um beijo
mais frio
a chuva na fonte
a luz das
promessas
morte em
vida
a vida é
perfeita
vida que se deita
pra se
revelar
se deixa levar
prima
fantasia
voz da esperança
de vencer o
dia
surpresa do tempo
tristeza não
deixa
valente presença
não se
acomodar
é o que vai restar
a fé das
crianças o
que ainda é virgem
define a
harmonia
o que ainda é simples
a arte, a
alegria ainda
aceito
e o que mais
brilhar
sem o desprezar
presente
restrito
contínua vida
depois
infinito
herança ainda
quente como
um beijo
ao fim não termina
de amor no
sonhar
só paira no ar
07-01-10
SECÇÃO
Que fossem as coisas do que são livres metades
resignando-se da divisão o infinito
e eu, só meio eu seria aflito
permutando as faces dúbias da verdade
Na raiva e no pavor seria o grito
contido e compreendido em intensidade
ao apego restaria pouco alarde
o mal, hoje tal, também segar suscito
Mas clamo, ó deus da conjuntura, que Vossa Majestade
conservai-me o entendimento pleno e irrestrito
pra ver tudo ir-se fácil da totalidade
E assim, fragmentado morro, mais pleno ressuscito
certo de que me caberia muito mais vaidade
e só com o dobro de humildade quiçá me justifico
24-03-10
DOLENTE
MAVIOSA
Das ruínas que se formaram em lento processo
onde vultos são lembranças ao silêncio condenadas
reluz minha condição, cabendo-me aceitá-la
e se eu quiser protestar, destoar os ares tranqüilos
agruparei os escombros abissais do presente
sabotando a aracnotecnia mecânica que tece os destinos
rejeitando todo o filoreligiomoralismo
transitando com a mesma leveza
nas rotas eqüidistantes do análogo e do paradoxo
mãos a revolver, voz a retumbar
decompor a harmopocrisia
até colher da verdade minha real diferença
21-10-10
DESBRAVADORES
NO TEMPLO DE ZÉ-RÁ
I
Quando, enfim, te postaste ao meu lado
e a vida sorrindo para mim
das estrelas fez flores de jardim
e de mim, bom pintor apaixonado
minha pena, cumprindo seu traçado
tua face divina retratou
e com tinta celeste pincelou
o jardim, paraíso de minha vida,
de onde nunca, jamais tive saída
e minha ânsia por ti se propagou
O instante surdo ouve o
grito,
um relógio a se
descondicionar
sem limites pra se
apaixonar
incansável a correr o
infinito
e ainda que o tatear
aflito
tua ausência temível
constatou
a pintura miragem que
sobrou
revelando os segredos
da esperança
o amor indelével na
lembrança
a querer-te conquistar
sentenciou
21-10-10
II
À vontade no tempo
resistindo na raça
recolhendo as idéias
esquecidas na massa
se arrumando para a
guerra
engendrando estratégias
pra não ter que lutar
tanta certeza já deve
bastar
um sorriso no rosto
uma meta tranqüila
a linha da vida
nesta mão atrevida
a tatear sem pudor
E quando a maré vira
a justiça declina
o azar é o tremor
dos planos a ruína
as lágrimas são
espelhos
onde as estrelas
tristes
sempre se fitarão
Varro as estrelas
caídas do chão
já laçando o impulso
já selando a vitória
alinhado ao futuro
com a linha da vida
desta mão atrevida
tateando sem pudor
31-10-10
SINESTESIA
IV
Na dúvida, interpelei o destino
flertei com a ousadia
rompi com o remorso e a solidão
fui sincero com meus sentidos
apanhei dos meus instintos
planejei amores, experimentei sorrisos
servi e provei sem ser visto
expus ao extremo meu vigor
mental e físico
e s’ em dúvida, gerei tudo isso
com certeza fitei o infinito
31-03-11
MUNDO
DA RAZÃO
Há um estranho vazio nos conselhos do destino
vultos com rostos indistintos que perambulam
por cenários austeros, paisagens grandiosas
são só conflitos de desejo de conceber
Cada pensamento é um fragmento dito ou não dito
são como moléculas de átomos de poesia
a contemplação é o destino que transcende o futuro
germinam abundantemente linhas filosóficas advindas do transe
Não há filosofia no intuito súbito
Não enganarei ninguém com esta honesta poesia
que não quis contemplativa, abundante, advinda
apenas um fruto da árvore da vida, apenas linda
11-04-11
a morte de Elizabeth Taylor
OS SONHOS SÃO NOSSOS FILHOS MAIS PARECIDOS
NOSSAS PROJEÇÕES E REPRESENTAÇÕES INSUBSTITUÍVEIS
NOSSOS ESPECTROS INDISCUTÍVEIS
CONCEBIDOS SEM RECEIOS, EXPANSIVOS SEM LIMITE
DE DIVINAL TECIDO, POENTE SUBLIME
QUE N’AURORA JAZEM, SEGADOS, PERECÍVEIS...
11-04-11
...à Liz
...mas são os sonhos que movem o mundo
são os filhos fragmentados vivos da existência, da alma
uma cadeia de amor contínuo
através da beleza sonhos se justificam
e seres se imortaLIZam
11-04-11
☼27-02-1932
†23-03-2011
CARAVANA
Vamos eu, a dor e o amor no mesmo barco
confiantes no equilíbrio pra empunhar o arco
neste mar revolto que a bravura desafia
somos tantos loucos que inspiramos simpatia
Vemos raiar tu, paixão arrebatadora,
vagamente te saudamos, nossa vencedora
mas não nos dignamos crer de teu juízo
toma-nos em metade, o resto é improviso
Somos parecidos, alvos dos mesmos fins
vida e luz e brisa, faces dos jardins
imperfeições valentes diante da ferida
astros se alinhando rumo à antivida
19-04-11
SINESTESIA
V
Para honrar o fragmento de mim em que acredito
dispenso ser maior em sabedoria ou grito
não preciso ver com os olhos do deus do infinito
só vislumbro o valor do que nos alivia
e não por vaidade, mas por analogia
quando nada se espera ao fim de um triste dia
o poder justificá-lo pela poesia
afia a lâmina da esperança de um mundo bonito
31-05-11
PRODUTO
Tento há tempos escrever sobre o sabor
quiçá não novo, certamente estranho de velhas emoções
a inspiração vem não em versos, construções rígidas
isoladas quase sem alma, desencantadas com qualquer perda
assim tão diretas, mas não menos confusas
deixando pouco de Woody Allen em
meus sorrisos
Aprendi quase tudo sem saber ser eu mesmo
Para onde foi a poesia nessa crise crônica?
Os olhares céticos e os ouvidos desanimados
sufocaram até que se cessasse a voz frágil do lirismo?
Seguiu, montada nos ventos, ao seu quarto de Olimpo
lançando aos seus devotos pétalas tenras de utopia?
Ou se vestiu de crônica, como a chama, de cera
e exercita sua essência de tudo revelar?
O que se descambou?
O que me impele a retrair o passo da obstinação
e destoa das vibrações flagrantes em minha vida?
Minha sinceridade acusa
MINÚCIA
DO OBJETO GRADUAL
Sobre os escombros da esperança, eis a Tecnologia
seus sinais são a plenitude e os passos do vício
conflitos e discrepâncias que se harmonizam
depondo o suave véu que nunca existiu
Tanto que não sabemos como nunca soubemos
o original pecado foi nosso amor secreto
a evolução humana não veio, mas venceram os desejos
fragilidade doravante é todo afã primitivo
A nova ordem é a que contradiz
a ser seguida é a luz que os olhos ofusca
a analogia jaz nos antagonismos
só há segredos no tempo e no silêncio
Os símbolos ficaram rasos e abandonados
de seus significados nasceram luzes infindáveis no espaço
e seus mistérios poluem-nos com detritos
estamos prestes a desfalecer na superfície
21-07-11
A
NOITE
A noite
Sua voz, suave como música
sussurra estranhos silêncios
composto material de infindáveis segredos
sob véu esvoaçante de luzes tênues
até onde desertos se dão ao alcance
aterrissa em minh’alma humana
e em uma descoordenada parte
o mais firme sentido brilha
13 e 14-09-2011
FAUX SENSATION
É o Fim
Como se tudo conspirasse até o cessar terrível
Fruto natimorto do clamor das utopias
Resplandece, enfim, em fênix com a coroa da razão
É o Abrupto
Tanto imortal quanto esquecido
Sensação pós-nausea, medo pós-júbilo
A derradeira lógica para sempre incompreendida
É o Extremo
Trevaquedevoraluzquedissolvetrevaquesuplantaluz
Uma inversão completa da existência
A necessidade zero de sentido
A última metáfora
O descanso dos eufemismos
O toque de recolher da imaginação
A Ordem
Enfim, em intrusão
Sobrenatural e soberana
É a maior das mentiras:
É o Futuro
12-09-11
FIM
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